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Procura-se Golpista de WhatsApp

O Storytelling de um golpe no WhatsApp pode te ensinar muito. E ainda pode fazer com que você olhe para os dados de outra forma.

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Se você abriu o seu Instagram ou TikTok nos últimos dias, deve ter sido difícil você escapar de um wrapped de alguém do Spotify. Já se você é um pouco mais do “deep digital”, deve ter se deparado com algum wrapped do Reddit. Ou então, você pode ter sido impactado por alguns memes criando provocações sobre como seria o seu wrapped do iFood ou do Tinder… Bom, mas se você ainda está perdido nessa conversa, aqui vai um breve wrap up do assunto. Os wrappeds são, basicamente, uma retrospectiva do ano, que analisam todos os seus dados de determinada plataforma, para contar uma história. Falar sobre seus gostos musicais, assuntos abordados, bandas favoritas, podcasts mais escutados (aqui nosso obrigado a todos que compartilharam o MorseCast nos seus rankings). Em resumo, utilizam os dados para criar uma narrativa, nesses casos tão interessantes e relevantes que, com ajuda de uma boa apresentação gráfica, faz com que todos saiam, orgulhosos, compartilhando por aí.

Confirma o código enviado e manda um Pix?

Agora, outro storytelling que com certeza você recebeu ao longo deste ano deve ter sido o do “seu familiar” que mudou de número de telefone, estourou o limite do banco e pediu para você fazer um Pix ou pagar um boleto rapidinho que depois ele te pagava… Ou então alguém pedindo para você confirmar algum cadastro qualquer e no final te mandando um SMS para você validar um código, que depois você descobre que, simplesmente, era a senha do seu WhatsApp que, bem, na verdade, a partir daquele momento, nem é mais seu…

Quase mandamos um Pix!

Uma pauta sobre o uso de dados para criar histórias, fazendo uma analogia entre os crimes cibernéticos e a estratégia digital das empresas, já estava aqui na gaveta há um tempinho, mas antes de trazer para vocês nossa opinião, ponto de vista e provocação, queríamos, literalmente, cair nesses golpes para trazer uma experiência própria para nossa conversa. Bom, por falta de um, caímos em três… Caímos não, nos deixamos levar… por três golpes digitais. Dois deles com objetivo de clonar nosso zap, e um pedindo para pagar um boleto de R$ 9.638,34 (!!!) de uma parcela atrasada de um financiamento imobiliário de um suposto parente que tinha acabado de trocar de linha telefônica e ao mesmo tempo teve sua conta corrente travada.

Storytelling…

Trazemos abaixo o trecho de uma das ligações que nos deixamos levar:

– Olá, tudo bem? Estou falando com o Fulano?

– Sim. Quem gostaria?
– Sou da “Imóveis Digitais” (nome fictício para contextualizar sobre algum grande portal de imóveis). Você possui um imóvel à venda conosco, certo?

– Oi, tenho sim.
– Você poderia confirmar as informações por favor? (Trigger 1: aqui ela percorre os detalhes do imóvel)

– Sim! É isso mesmo, o meu imóvel.

– Perfeito! Estou ligando pois temos recebido reclamações de nossos clientes sobre receberem muitas ligações de corretores de imóveis e nem tantas ofertas reais de interesse de compra. (Trigger 2)

– Sim! Comigo tem acontecido direto.

– Perfeito. Pensando em nossos Clientes, lançamos um novo plano que restringe o seu anúncio e promove ele em destaque apenas para potenciais compradores. Você teria interesse? (Trigger 3)

– Sim, conta mais.

– O novo plano custa R$ 380,00 mas, para quem está conosco há mais de X meses, (Trigger 4) estamos hoje com uma promoção 100% cortesia para as primeiras 100 contratações. Você teria interesse?

– Sim! Eu quero.

– Ótimo, basta você acessar sua conta, fazer o cadastro e mudar as configurações do seu anúncio. Mas sugiro fazer rápido pois já tivemos 98 contratações hoje e existem apenas mais 2 disponíveis no pacote gratuito.

– OK, vou ver aqui, porque não estou em casa agora.

– Se não quiser correr o risco de perder essa oportunidade, posso fazer o cadastro por você direto aqui no sistema, rapidinho, interessa? (Trigger 5)

– Sim! Por favor. (aqui você estaria achando ela sua melhor amiga, justo no momento que ela preparou a arapuca)

– OK, poderia apenas confirmar a sua conta me passando rapidinho aqui o código que você vai receber por SMS?

E aqui, simples e rápido assim, lá se iria minha conta do WhatsApp, e o início de diversos problemas.

O golpe, por mais que para uns possa parecer óbvio, possui uma narrativa tão envolvente que tem gerado enormes prejuízos, a ponto de o WhatsApp criar uma campanha de prevenção com o Porta dos Fundos que foi ao ar ontem.

Small Data, Big Context

Fazendo uma rápida análise do que aconteceu, e percorrendo os triggers marcados acima, um primeiro resumo seria: com poucos dados, sendo que 100% deles públicos (disponíveis no portal de imóveis para potenciais interessados), mas contextualizados dentro de uma dor real do cliente e com um storytelling envolvente, conseguiu criar uma narrativa a ponto de engajar e quase converter até mesmo quem estava ali como um “agente infiltrado”, se achando o 007 em missão contra o crime cibernético.

Sobre os Triggers;

  • Trigger 1: ao trazer uma série de informações do apartamento, cria-se uma relação, pois passa credibilidade. Porém, todos eram dados do anúncio, ou seja, eram públicos e disponíveis a todos.
  • Trigger 2: em menos de 2 minutos de conversa, e após criar um vínculo, ela apresentou uma dor real do cliente, gerando curiosidade.
  • Trigger 3: baseada nos dados, e na dor do cliente, diz que tem uma solução, gerando interesse.
  • Trigger 4: ao dizer que a promoção tem uma data para terminar, ela gerou o senso de urgência.
  • Trigger 5: a cartada final vem ao simplificar a sua vida, quase como se fosse um concierge do crime, gerando conveniência.

O ROI do crime

Se você acha que essa narrativa é algo pontual, feito de forma amadora, e que não tem ganho de escala. Aqui você se engana profundamente. Assim como toda grande empresa, no crime também é preciso analisar o ROI, e ter certeza que a conta fecha. Padronizar as ações, utilizar sistemas e tecnologia, criar processos e até comprar mídia de performance em plataformas como o Google são pontos importantes para garantir um Crime próspero e rentável. Afinal de contas, de que vale ser um criminoso que dá prejuízo… Segundo dados da Axur, empresa especializada no combate a fraudes e crimes cibernéticos, o crime atingiu um nível de profissionalização que hoje, sem o trabalho de empresas especializadas em combater os crimes digitais, fica realmente difícil acompanhar e proteger empresas e clientes de todas as diversas possibilidades. “O grau de criatividade, somado à estratégia e nível de eficiência dos fraudadores, vem transformando o crime cibernético em algo extremamente rentável, por isso o crescimento exponencial do número de casos, e a preocupação de empresas e, até de pessoas físicas, em se proteger. Nossa solução atende desde pessoas físicas, gratuitamente, até grandes empresas e órgãos policiais”, comenta Tiago Bordini, Head de Cyber Threat Intelligence da empresa.

Crime de performance

Ainda segundo dados da Axur, os segmentos que mais sofreram fraude de phishing nos últimos meses foram o e-commerce e os bancos e financeiras. Aqui é interessante pensar que esses são um dos segmentos que mais investem em mídia de performance. E, como também comentado por Bordini em nossa entrevista, os fraudadores hoje possuem uma estratégia de mídia de performance tão eficiente que disputam bids por compra de palavras-chave no Google frente a frente às grandes marcas do mercado.

Tudum

Mas o que tudo isso tem em comum? Do wrapped com suas músicas favoritas, passando pelos assuntos que você mais engajou no Reddit e chegando nos diversos golpes pelo WhatsApp e mundo digital afora, o que conecta tudo isso é o poder de transformar dados em histórias, capazes de engajar audiências a ponto de tomar atitudes, sejam a de divulgar um story com suas músicas favoritas, seja de fazer um Pix para um desconhecido sem pensar muito se aquilo faz sentido… Nos últimos tempos, com o avanço das gestões data driven, inúmeras foram as discussões sobre criatividade vs. inteligência de dados. Na semana passada falamos aqui sobre o desafio do futuro, que contempla a capacidade de se fazer uma gestão combinada entre inteligência humana e inteligência computacional, e o Netflix nos mostra, a cada novo lançamento, o quanto os dados são a base para nortear suas narrativas.

Data Storytelling: como utilizar os dados para criar e contar histórias

Nos últimos tempos, e até por influência de alguns grandes cases como a própria Netflix, o “big” do “big data” ganhou destaque e gerou uma sensação de que a importância está no quanti e não no quali, e empresas passaram a se orgulhar, e focar cada vez mais, na quantidade de dados coletados e disponíveis e não nas histórias que conseguem contar com eles. Seja da porta para dentro, seja da porta para fora. Segundo estudos, em mais de 70% das grandes empresas as áreas não diretamente relacionadas a BI e Data Analytics nem sabem quais dados sua própria empresa possui à disposição para uso em iniciativas internas. E, dos 30% que sabem (ou acham que sabem), 75% não sabem como inseri-los em seu dia a dia para otimizar suas rotinas, processos e entregáveis. Em reportagem do ano passado do MIT, uma frase se destaca: “As with any good story, a data tale needs a beginning, a middle, an end, and some actionable insights. Data scientists aren’t always up to the job.” Ou seja, toda análise de dados precisa ser um começo, meio e fim, e contar uma história, e nem sempre os cientistas de dados são as pessoas mais qualificadas para isso.

Precisa-se de um golpista de Whatsapp; paga-se bem.

Brincadeiras à parte, e longe de querer fazer apologia ao crime, mas, se nossa querida criminosa da experiência relatada acima quisesse largar o mundo do crime e entrar no mundo corporativo, ou da educação, eu ousaria dizer que ela teria uma excelente oportunidade pela frente. Poderia ter ali uma bela consultoria ou aula sobre data storytelling como estratégia digital de performance. Enquanto marcas possuem dificuldade para engajar potenciais novos clientes para comprar produtos, ou até mesmo engajar os atuais clientes para ações mais simples como migrar um plano, ou simplesmente aceitar receber a sua fatura digital ao invés de por papel, o cyber crime consegue, com menos dados, porém com mais estratégia, ter conversões mais eficientes em assuntos mais delicados e com valores maiores. De um lado, grandes empresas acumulam milhões, ou bilhões de dados, contratam soluções milionárias para analisar e tratar os dados, mas muitas vezes não conseguem transformá-los em histórias… De outro lado, fraudadores fazem uso de poucos dados, em média 3 a 4 informações por usuário, na grande maioria dados públicos, para criar histórias envolventes pautadas em contexto para criar gatilhos de comportamento.

E o Wrapped da sua empresa?

Como sempre, trazemos nossas provocações não para que vocês necessariamente concordem com tudo, ou mesmo com parte, mas sim que se sintam provocados a analisar seus negócios, suas empresas ou carreiras através de outras perspectivas… Assim sendo, e já chegando próximo ao final de ano, fica aqui a nossa provocação; Num ano no qual “big data” e “data driven” devem ter feito parte do seu vocabulário, quase que diário, além de estar presente na sua estratégia e execução ao longo do tempo, como seria o Wrapped 2021 do seu negócio? Você conseguiria organizar todos os dados gerados e acumulados a ponto de criar uma história, interessante e envolvente, capaz de gerar insights que possam ser compartilhados com orgulho, seja internamente ou para o mercado? Ou sua retrospectiva de 2021 estará mais próxima de uma coleção de fotos e fatos do ano seguida de uma trilha musical com “Hoje é um novo dia, de um novo tempo que começou…”

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