Mohamad Ali, o CEO da IDG, conta como está sendo a luta para transformar a mídia em tech
Da news para o ring
Cada dia é um gancho de direita seguido de um gancho de esquerda no mundo da mídia: são big techs canalizando audiência proprietária, é fim dos cookies, briga por dados, começo de regras novas da Apple… E, para estar preparado para essa briga, a gente chamou o Mohamad Ali. Não, não esse Mohamad, o outro: o CEO do IDG.
Na última semana, o grupo de sites de tecnologia e de consultoria International Data Group (ou IDG) foi comprado pelo fundo Blackstone por US$ 1,3 bilhão. A premissa para essa aquisição e valuation? De que eles são uma empresa de tecnologia. Antes disso, lá em 2020, eles já tinham comprado uma martech (e lá, lá, lá atrás, em 1964, eles começaram sendo uma newsletter, daquelas de papel, sabe?!). De qualquer forma, Ali, que entrou como CEO da companhia em 2019, foi um dos responsáveis por esse giro da empresa de mídia, que como algumas outras já poderia ter jogado a toalha, em uma companhia tech, que essa semana levou o cinturão. E conta um pouco para a gente por aqui:
—
Mohamad, antes de começar a falar sobre sua carreira, vamos dar um passo para trás. Afinal, os resultados sempre são mais reconhecidos do que o começo, que na maioria das vezes é onde há dificuldades e pequenos obstáculos. Conta pra gente um pouco da sua história pessoal.
Em 1970, ano em que eu nasci, o ditador da Guiana declarou o país uma república cooperativa e aprofundou as relações com Cuba, Coréia do Norte e União Soviética. As importações foram proibidas. O país começou a nacionalizar empresas. Em 1979, o setor privado estava reduzido a apenas 10% da economia. Havia uma escassez generalizada de alimentos, combustível, água e eletricidade. Meus pais perceberam que não era mais um bom lugar para criar filhos e, em 1980, decidiram que era hora de ir embora.
Em 1981, minha mãe e eu chegamos ao aeroporto JFK em Nova York com um total de US$ 34 no bolso. Lembro-me bem da experiência. Quase tudo era diferente e nos sentíamos perdidos. Uma das primeiras coisas que minha mãe e eu vimos no aeroporto foi uma máquina diferente de tudo que havíamos visto antes. Fizemos uma pausa antes de usá-lo, para garantir que tínhamos um plano para usá-lo com segurança. Era uma escada rolante! Naquele momento, parado no fundo do que parecia ser uma maravilha tecnológica, não poderia imaginar que um dia seria o CEO de uma empresa de tecnologia.
(Entrevista a Authority Magazine publicada em 19 de agosto de 2018)
E não só uma empresa de tecnologia, mas um grupo de empresas! Mohamad, sabemos que você já trabalhou na HP e na IBM – inclusive aqui liderando a criação da unidade de software de análise de negócios. Você foi CEO da Carbonite, que oferece serviços em nuvem B2B, onde você ajudou a mais do que duplicar a receita, o que te fez fazer a transição para o IDG?
Estou incrivelmente orgulhoso de tudo o que realizamos juntos. A Carbonite tem uma ótima equipe e acredito que era o momento certo para fazer a transição. Estou ansioso para seguir o sucesso contínuo da empresa mas estava na hora de buscar outras oportunidades profissionais “na indústria de mídia e pesquisa”.
O IDG tem sido o padrão ouro para mídia, pesquisa e insights de tecnologia por mais de meio século. Estou honrado por ter a oportunidade de liderar o IDG em seu próximo capítulo.
( Boston Business Journal em 25 de julho de 2019)
O IDG, para quem está um pouco perdido, é um grupo de mídia e comunicação que tem mais de 300 revistas pelo mundo e, pelo menos, 5 revistas globais: a CIO, a Macworld, a PC World e a ComputerWorld. Além disso, vocês ainda tem uma divisão de pesquisa de mercado de tecnologia, o IDC. Qual foi o maior desafio que rolou quando você entrou no posto?
Entrei na empresa há dois anos porque havia essa tendência de desaparecimento de cookies de terceiros. Eu sabia que o espaço da martech teria que se refazer completamente e que a maioria das 7.000 ou mais empresas de martech estariam sob grande pressão. Eu me juntei à ideia de alavancar um grande número de relacionamentos primários com, especificamente, compradores de tecnologia – pessoas que podem operar departamentos de TI ou gastar um milhão de dólares em arrays de armazenamento flash.
(Entrevista ao AdExchanger em 8 de junho de 2021)
Como você se sente agora sendo CEO da IDG e qual futuro você quer construir para a empresa?
Animado com a oportunidade de pegar uma grande empresa de notícias e conteúdos e transformá-la em uma grande empresa de tecnologia. Há um negócio incrível a ser construído com base nesses ativos.
O plano é impulsionar o marketing direcionado e o lado de geração de demanda do negócio que atende compradores e fornecedores de tecnologia com software que pode transformar o negócio em uma empresa de automação de marketing.
É uma empresa de mídia, mas através de elementos importantes se transformará em uma empresa de tecnologia, fornecendo muitos desses ativos por meio da tecnologia. Não acho que o mundo pense nela como uma empresa de tecnologia, mas também acho que eles já começaram e provaram alguns elementos tecnológicos. Acho que posso entrar e desenvolver o bom trabalho que eles começaram.
As linhas estão se confundindo atualmente entre as empresas de tecnologia e mídia. O Facebook é uma empresa de mídia ou de tecnologia? Acho que temos oportunidade nessa transição.
(Entrevista ao site XConomy em 26 de julho de 2019)
E como o IDG está se preparando para essa mudança dos cookies de terceiros?
Por muito tempo estivemos colocando first party data na troca aberta, mas nós fechamos isso. A única maneira de acessar nossas conexões de público-alvo agora é por meio de nós e de nossa mídia.
Esses relacionamentos com terceiros já foram encerrados no FireFox e Safari – e em breve no Google. Também é cada vez mais difícil no lado mobile. Quaisquer empresas que dependem de cookies de terceiros ou dados de bidstream estão sob pressão crescente. Acreditamos que os first party data se tornarão premium novamente.
Agora temos toda a pilha de tecnologia por trás de nosso conteúdo, aproveitando esses relacionamentos de first party. Temos um banco de dados de duzentos milhões de relacionamentos primários, que impulsiona os dois lados da empresa. No lado do IDC, passamos de um modelo de dados estáticos para uma API que pode ser consumida rapidamente. Isso tem sido um grande esforço nos últimos dois anos.
.
(Entrevista ao AdExchanger em 8 de junho de 2021)
Você planeja combinar o lado da tecnologia de marketing e licenciamento de dados do negócio com a tecnologia de mídia e publicidade?
Existe uma oportunidade de colaborar, mas não estamos fazendo isso agora. Administramos IDC [área de pesquisa] e IDG Comms [área de comunicação do IDG] como negócios separados. Estamos construindo a pilha de tecnologia, mas a oportunidade até agora tem sido modernizar cada lado do negócio. Estamos construindo a camada de dados e, à medida que construímos o conjunto de dados IDG Comms, encontraremos as sinergias entre esse lado de negócios e IDC.
(Entrevista ao AdExchanger em 8 de junho de 2021)
Falando um pouco de mercado, o que a tecnologia é pra você? Você acredita que estamos caminhando para uma era de bolha digital ou acredita que realmente a tecnologia está se expandindo por conta do crescimento e visão de mercado das empresas?
Então sua questão sobre uma bolha, muitas vezes quando falamos sobre uma bolha falamos sobre o mercado de ações ou sobre o mercado financeiro. Eu realmente não posso comentar se essas ações de tecnologia estão supervalorizadas ou não, mas o que eu posso dizer é que não acho que isso seja um sinal na tela do radar.
Acho que a tecnologia veio para ficar. Eu acho que a tecnologia tem conduzido a humanidade por milênios, desde a invenção do aço, a locomotiva, o telefone, até a internet. A diferença é que a taxa de mudança acabou de aumentar dramaticamente e continuará aumentando.
Obviamente, estamos vendo tecnologia e empresas de tecnologia, mas também estamos vendo empresas não tecnológicas se tornarem empresas de tecnologia. Na IDG temos vários negócios, temos o IDC que é realmente um tipo de negócio de dados e tecnologia, mas também temos um negócio de mídia, temos um negócio de eventos, temos uma plataforma SaaS de geração de demanda, que é claramente um negócio de tecnologia.
Mas aquele negócio de mídia, houve um tempo em que estava no papel e hoje é tudo digital. E há um back-end muito sofisticado que alimenta nossas publicações, como a revista CIO em todo o mundo e, centenas de países que se tornaram uma empresa de tecnologia. Muitas indústrias tradicionais estão se tornando empresas de tecnologia. Acho isso veio para ficar.
(Entrevista ao podcast On The Board em 15 de novembro de 2020)
Vamos falar sobre a Tribilio, a martech que vocês compraram lá em 2020. Ficamos curiosos para saber porque a plataforma de marketing baseada em conta foi sua primeira compra como CEO da IDG.
Conversei com a Triblio na minha primeira semana como CEO do IDG.
Para mim era bem claro que a IDG era uma empresa de tecnologia. E tinha uma quantidade de ativos para solucionar um problema bem contundente: abrir espaço para marcas conversarem com o meio e o final do funil de vendas para B2B. Isso porque, no topo de funil, já há domínio de empresas como Salesforce e Oracle, mas a outra parte, tem mais de 7 mil vendedores, e para mim ver que tinha essa quantidade de empresas e um problema foi um sinal vermelho. Reconheci desde o começo que a IDG, na nossa divisão IDC é powered em AI e baseada em dados, e bem sofisticada. Na parte de mídia e comunicação, temos uma série de sites no mundo todo que estão todos baseados na nossa tecnologia: temos a maior base de dados first-party dos compradores e vendedores de tecnologia.
Uma das coisas que faltavam para a IDG era uma plataforma de ABM [ou Account Based-Marketing], e acabou sendo a Tribilio.
O marketing hoje em dia já é um segmento multicanal, conseguir orquestrar o tempo correto, com a audiência correta e a mensagem certeira é muito complicado. Com a Tribilio a gente consegue criar essa orquestração e deixar as relações mais inteligentes.
Temos mais de 200 milhões de usuários de tecnologia nos nossos sites, entre 50 milhões e 60 milhões deles estão ativamente procurando por produtos de tecnologia, com uma plataforma de martech nós podemos conectar quem está vendendo a se conectar com essas pessoas.
(Entrevista publicada no Demand Gen Report em 29 de julho de 2020)
Qual o plano para o IDG depois da aquisição da Blackstone?
A Blackstone basicamente disse: “Continue fazendo o que está fazendo”.
Com a diferença que agora temos um grande talão de cheques para sair e adquirir novas peças para a plataforma.
Nós estamos no meio de um caminho de três anos para fazer o nosso IPO, uma caminhada que começou em 2019. Nosso objetivo é estarmos prontos para o IPO até o final de 2022.
A saída de sucesso, na perspectiva da Blackstone, seria ter uma camada ABM de dados e, com isso, podermos integrar e comprar outras informações e dados.
E a Blackstone não está pensando pequeno, como aumentar um negócio de US$ 1,3 bilhão para US$ 2 bilhões. Se alguém aparecer e tiver uma solução de tecnologia de mercado verdadeiramente atraente para o meio e final do funil de B2B – isso é um negócio de US$ 20 bilhões.
(Entrevista ao AdExchanger em 8 de junho de 2021)
Falando um pouco de você: sabemos que nasceu na Guiana e que imigrou para os Estados Unidos com seus pais quando você tinha apenas 10 anos. De fato, a sua jornada para virar CEO é uma inspiração para muitos latinos. Como você vê a questão da diversidade e inclusão nas empresas? O que você acha que ainda falta para ter realmente diversidade e inclusão no mercado?
Estudos mostram que D&I [sigla usada para falar de Diversidade e Inclusão] beneficia os resultados financeiros, mas as empresas que praticam D&I apenas por esse motivo muitas vezes descobrem que não funciona. As pessoas veem através disso. A intenção, o valor e a autenticidade precisam estar presentes para que funcione. Participei pessoalmente de reuniões em que minha presença tornou o grupo racialmente diverso, mas não fui um participante pleno. Portanto, quando estou em uma reunião, certifico-me de que todos sejam ouvidos. A inclusão não significa que todos vão a todas as reuniões, mas sim que, se você estiver em uma reunião, será ouvido.
https://www.russellreynolds.com/insights/thought-leadership/q-and-a-with-mohamad-ali
Aqui no Ghost Interview passam vários grandes nomes da tecnologia e da inovação. Então fica aqui a nossa pergunta final: se você pudesse chamar qualquer uma dessas pessoas para um jantar especial e para conversar por um dia, quem seria?
Melinda Gates. Muito poucos fizeram tal diferença em nosso mundo. Como cientista da computação, líder empresarial e filantropa, ela é um exemplo para todos nós – adultos e crianças de todos os gêneros. A missão da Fundação Gates de reduzir a pobreza e aumentar as oportunidades educacionais se alinha profundamente aos meus próprios interesses e é uma inspiração para mim. Melinda Gates e seu marido estabeleceram um novo padrão de responsabilidade para o restante de nós.
(Entrevista a Authority Magazine publicada em 19 de agosto de 2018)
Que bom que estamos alinhados Mohamad, a Melinda já passou aqui pelo Ghost recentemente 🙂