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Ele mudou sua forma de ver conteúdo. Ele pegou algumas horas do seu sono. Ele frequenta seus jantares e tem mais atenção que seu namorado/a. Ele te conhece mais do que a sua família. Ele fez um dos melhores usos de dados e inteligência artificial dos últimos tempos (e foi criticado por isso). Ele virou tema de documentário da Netflix. Ele desafia as maiores empresas do mundo. Ele faz com que elas copiem outras empresas de forma descarada. Ele já teve e não teve likes… Ele é um dos protagonistas dos debates sobre o impacto das redes sociais em nosso dia a dia. Ele virou produto digital e as empresas que se especializaram nele agora estão até colocando ele a venda. Sabe de quem estamos falando? Dele mesmo, o Feed!

A venda

Resolvemos inverter a ordem desse nosso pequeno feed (que não tem nada de infinito, ainda bem!) para trazer o final para o começo. Ou melhor, em termos que os algoritmos de Feed entendem: demos peso maior para informação mais recente, publicada por uma empresa que interagimos muito (estaria na nossa lista de “melhores amigos”): a Bytedance. Isso porque, nesta semana, a companhia dona do TikTok lançou o Byteplus, uma plataforma de inteligência artificial para recomendar vídeos a partir de dados. Sim, a empresa transformou o algoritmo do seu feed em um produto SaaS, vendendo sua inteligência como serviço para outras companhias personalizarem seus próprios apps. Sim, mais ou menos como a Amazon fez com o AWS, e tenta agora fazer com o GO, entender seus principais ativos e monetizá-los de outras formas. Para alguns, foi quase como ler que o TikTok está vendendo uma receita de família, aquela guardada a sete chaves. Para a gente, no entanto, o movimento faz sentido, afinal: tudo, não só as redes sociais, vai depender do feed. E não é apenas pela oportunidade de receita, mas sim para alimentar ainda mais os algorítmos, e por consequência, melhorar ainda mais a otimização do próprio TikTok, que desta forma terá acesso a ainda mais informações, e de novos verticais e plataformas, sejam eles de conteúdo ou de serviços.

Scrolling up the Feed

Voltando à ordem normal da news, a gente quer pegar o DeLorean, o Doc e programar nossa viagem para revisitar três anos diferentes do passado: 1999, 2006 e 2007. O primeiro desses, um ano antes do bug do milênio (que acabou dando em nada), a Netscape criou o RSS, um agregador de informações de updates de sites. Basicamente, cada vez que uma webpage (sentiu o cheiro da naftalina daí?) era atualizada com novos conteúdos, esse código conseguia ler e passar para qualquer ferramenta que o traduzisse. De certa forma, foi esse o precursor do que conhecemos por feed de rede social hoje em dia, já que trouxe para uma linguagem mais acessível o que já era possível apenas no mundo dos dados. Pulamos então para 2006, quando uma novíssima plataforma de um novíssimo Mark Zuckerberg resolveu deixar de ser apenas um espaço para as pessoas criarem perfis e conversarem (ou flertarem) entre si para se tornar um lugar que agrega conteúdo. Em setembro daquele ano, e literalmente do dia para a noite, eles colocaram o “news feed” no ar, basicamente, uma área da rede social onde era possível ver o que os seus amigos quisessem publicar. Na época, o lançamento do Facebook foi… isso mesmo, um grande fracasso. Menos de um dia depois de lançado, já havia um grupo de um milhão de usuários chamado “Eu odeio o novo feed do Facebook” na rede. Quase 10% dos usuários ameaçaram desativar suas contas no FB, uma boa parte reclamou, falando que sentiram a sua privacidade invadida. O time do Facebook, no entanto, insistiu na feature por ver nela uma facilidade de uso, e também uma ferramenta capaz de manter os usuários engajados na rede. Agora vamos para 2007, quando o Facebook fez uma de suas aquisições mais importantes: o FriendFeed, uma plataforma que servia como agregador de posts de redes sociais. Contamos um pouco da história de um dos criadores do FriendFeed, que se tornou CTO do Facebook, no Ghost Interview desta semana. A questão é que, no FriendFeed, havia uma capacidade extra que logo foi absorvida por Zuckerberg: o botão de curtir.

Ao infinito e além

A parada na conversa agora é para a gente falar sobre um tema que é essencial para o mundo de tecnologia: sopa. Três pesquisadores norte-americanos queriam entender como a oferta de comida afeta a nossa sensação de saciedade e de fome; para tanto, chamaram uma galera para um experimento com uma espécie de tigela de sopa que se enche sozinha. o que eles perceberam foi, que aquelas pessoas que comiam nesses bowls sem saber consumiam 73% mais sopa que as pessoas em tigelas regulares e, pior de tudo, acreditavam que não tinham comido muito mais do que os outros. Juntamos isso a uma criação do começo de 2006: o scroll infinito, aquela página que nunca tem fim, sempre se atualiza quanto mais a gente puxa para baixo. Uma das pessoas que se diz o inventor desse design é Aza Raskin, que você deve conhecer se viu o documentário “The Social Dilemma” da Netflix. O pesquisador e designer criou essa forma de ver uma página por entender que, naquele momento, era uma facilidade para o usuário, que não tinha que ficar clicando em “veja mais” ou “vá para outra página” no final do site. E, por trazer essa facilidade, também aumentava o tempo da pessoa naquela página, exatamente como as tigelas de sopa. O mecanismo já estava no começo do começo do Twitter e, depois, se tornou popular com o feed do Instagram – lançado próximo de 2010, e se espalhou por, bem, todas as redes sociais que conhecemos.

A história continua

Quando juntaram o feed e o scroll infinito, o que aconteceu foi uma implosão na forma que as pessoas consomem informações. Para alguns, essa foi uma mistura não exatamente positiva, já que deu um empurrão no nosso vício por se manter informado e pela overload de informação, que induz o famoso “FOMO”, ou Fear of Missing Out (o medo de que você estå perdendo algo incrível ao ficar de fora das redes). Para outros, foi a única forma de se acatar a quantidade de dados e informações produzidas na internet. Para vocês terem ideia, em 2020, em um minuto da internet, os usuários colocam 500 horas de vídeo no sistema do YouTube; postam quase 348 mil stories no Instagram e mandaram 147 mil fotos no Facebook… Isso significa que, se todos os feeds parassem do dia para a noite, a gente ainda teria alguns anos de conteúdo para assistir, sem precisar de novidades, ia ser infinito mesmo. Para quem cria conteúdo, os “scrolls infinitos” trouxeram também a possibilidade de continuar a conversa, de criar histórias que podem durar várias semanas. Mas aí entra o outro ponto da equação do feed, um ponto tão complexo que nos leva ao começo da news: os algoritmos.

O que você gosta?

E para falar dos algoritmos, precisamos voltar ao botão curtir. Porque foi este pequeno ícone que transformou o feed em um espaço personalizado. A partir desta interação tão inofensiva, o Facebook começou a saber o que o usuário, de fato, estava fazendo quando estava logado: quais páginas gostava mais, quais conteúdos tomavam a sua atenção e com quais pessoas ele se conectava mais. Para o iniciante – e depois explosivo – negócio de ads do FB, esse botão trouxe a capacidade fora do comum de personalização dos ads e de entender os usuários – coisa que, naquela época, apenas o Google e as ferramentas transacionais tinham. E, por gerar tantos dados sobre os usuários, e por começar a compreender tanto quem estava ali trocando likes, os sistemas dos feeds passaram a mostrar apenas o que a gente gosta. Algo bem complicado e criticável das redes, para falar a real. Segundo esse articulista do NYTimes, o feed “arruinou a internet que a gente conhecia”, ao transformar o que era um espaço aberto, com blogs, sites nichados (quem não se lembra dos geocities?), páginas de notícias; em um “reino controlado pelos algoritmos – que ninguém entende como funciona”.

Quenhé vc?

Eis que os algoritmos, que começaram como meros otimizadores do conteúdo que a gente recebia, tomaram conta literalmente do que consumimos e como nos informamos. Cada atualização dos algoritmos se tornou uma correria para quem cria conteúdo para garantir que o assunto chegue no feed. Sim, pois estar fora dos principais feeds de hoje em dia, é como não existir… A organização muda a cada momento: já foi por data, por hashtag, por likes, por número de comentários ou palavras e, até, por assunto abordado. E é hora de voltar para o TikTok. Porque o que ele trouxe em termos de feed foi fora da caixinha para as redes sociais que, até aquele momento, se contentavam em entender bem o usuário e as @ que essa pessoa seguia, fazendo ligações a partir dessa rede; o que o TikTok trouxe foi o contrário: entender o que estava sendo postado para, depois, levar isso para o público. Para quem usa o app isso se traduz como: a For You Page – um espaço com indicações infinitas de vídeos curtos de pessoas que você não exatamente segue, mas que, de certa forma, conversam com os conteúdos que você já consome. E está aí uma fronteira que o Instagram está tentando cruzar: eles já informaram que aumentaram a capacidade de recomendar conteúdo de outras pessoas para os seus usuários nos próximos meses (alguns dizem que ele está querendo se tornar o TikTok). O algoritmo do TikTok analisa pontos como a imagem dos vídeos, o texto que é falado, os trechos de som usado, os filtros escolhidos e até os tipos de filmagem, tudo isso se une ao engajamento que o usuário tem com o conteúdo – e aí não é apenas comentar ou dar um amei, mas compartilhar com os amigos, ver o vídeo inteiro e repeti-lo. Os pontos que existem no aplicativo são muitos e foram criados para serem assim, como as áreas de compartilhamento e os vídeos em si. Diferente de apenas uma foto ou vídeos de stories, que são fechados a um público seguidor. Ah, e ainda tem a questão de design: a timeline realmente infinita, que toma a tela toda, que traz uma imersão para o usuário, em outras palavras, uma tigela gigantesca que se enche sozinha de sopa. Isso tudo torna o app muito rápido em alinhar o feed com o que usuário é, ao ponto de assustar alguns. Ou seja, faz todo sentido que eles estejam vendendo essa exata tecnologia como serviço, porque, veja bem, as marcas vão precisar.

Não é só isso..

Até agora, tudo o que falamos se encaixa nas redes sociais, tanto que te faz pensar “o que isso pode significar para mim?”. O negócio aqui é que o conteúdo tem sido um espaço de convergência para diversos setores, de fintechs a companhias aéreas, todas as empresas querem marcar a sua presença online a partir do conteúdo. Pois bem, e qual a melhor forma de mostrar uma grande gama de conteúdo se não de uma forma personalizada, num feed? Sabemos que o Rappi e o Uber Eats acrescentaram “stories” aos seus aplicativos, dando a restaurantes a opção de mostrar algumas atualizações aos seus possíveis clientes. O WhatsApp também adicionou a ferramenta, de olho na forma com que as pessoas interagem no aplicativo. Algumas fintechs, como o PicPay, também estão pensando nessa forma de mostrar o conteúdo financeiro para os seus clientes, integrando facilidades de mensagem e de compartilhamento de informações no app. De acordo com o TikTok, os primeiros compradores de sua solução algorítmica foram dois aplicativos de compra, um apenas de roupas, e um outro de turismo, chamado WeGo. Quanto tempo até isso chegar nas varejistas brasileiras – que já estão correndo atrás de se tornar um superapp?

Tomando a sopa pelas beiradas

Por fim, se você é um usuário, importante saber que a sopa pode estar sendo continuamente reabastecida, sem que por vezes você saiba, então é importante todos nos organizarmos e termos processos e metodologias para nos manter informados, desviando de algoritmos, otimizando nosso tempo e baixando o nosso FOMO. Inclusive, nosso podcast de ontem fala um pouco sobre isso. Já se você é uma marca, um varejista, uma fintech ou qualquer outro negócio, vale pensar como a estrutura de feed pode impactar seu negócio, seja como um desafio, ou seja como uma oportunidade. Mas lembrem-se, os usuários estão cada vez mais antenados sobre como esse mundo funciona, então, que seja um Feed do Bem 🙂

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