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De Telco para Tech-Co

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Estamos vivendo uma enorme batalha, envolvendo as maiores empresas de tecnologia do planeta, com um único objetivo: quem vai dominar a digitalização através dos smartphones, e os desdobramentos de um mundo com a evolução desses aparelhos. De Google a Facebook, passando por Apple e Samsung, envolvendo Amazon e todos demais aplicativos de messaging e Super Apps, e agora players como Microsoft, Oracle e até Walmart, vendo no TikTok uma forma de entrar, ou retomar, essa batalha. Todos atrás do mesmo objetivo: formas de conhecer, ativar e monetizar usuários mobile.

Na contramão, existe um grupo de empresas que faz isso desde de sempre, porém focado em suas ofertas core e sem ter criado um ecossistema mais completo, as Operadoras. Porém, esse jogo pode estar mudando, e aqui vai um pouco de como tudo está se movimentando. Tanto que já existem exemplos mundo afora: na Índia, no Japão, nos Estados Unidos e, até mesmo, aqui no Brasil.  

Uma fábula indiana

Direto de Mumbai, vem o exemplo de que os serviços digitais podem transformar, ou até mesmo criar, uma operadora, aumentando a base de usuários e alavancando novos negócios. Estamos falando da Jio, ou melhor da Jio Platform que  tem chamado atenção do mercado ao conseguir investimentos bilionários de companhias como Facebook e Google.

Mas o que é a Jio Platforms, exatamente? É um conjunto de empresas que une a Jio – maior operadora telemóvel da Índia, que lançada em 2016 já possui mais de 30% de market share – e todos os serviços digitais, TODOS mesmo: streaming de TV, aplicativo de mensagem, plataforma de videoconferência, aplicativo de compartilhamento de documentos, app de revista e jornal, serviço de cloud, app de segurança, serviço de pagamento digital e um de delivery de supermercado. Diferentemente da China, no qual os “super ecossistemas” nasceram nos Apps de Mensageria, na Índia o case da Jio mostra como uma Operadora pode dar as cartas nesse mercado. Um verdadeiro Telco Marketplace.

Os números mais recentes colocam o valuation da Jio Platforms em US$ 65 bilhões. Dado esse tamanho todo, vocês estranham se a gente falar que a Jio Platforms foi criada em 2019 a partir de um “spin-off” da operação da Jio? Eles chegaram nessa fatia de mercado exatamente combinando planos enxutos, conectividade em vários espaços e, lógico, os serviços digitais (um exemplo? 93% da base de usuários da operadora, mesmo tendo os preços baixos dos planos oferecidos, aceitou pagar o Jio Prime, assinatura para ter acesso a alguns desses muitos serviços digitais que falamos). 

A parada das Big Techs

A equação que a Jio conseguiu resolver à sua maneira foi uma que já passa por operadoras há muito tempo, como equilibrar e trazer o poder da grande base de usuários, com os dados sobre eles e da capacidade de ativá-los com objetivo de gerar receita, e valor, da mesma forma que as Big Techs.

Pense no Google, principalmente nas receitas da empresa, a combinação destes três fatores, com uma linha de inteligência de algoritmos entre eles, tem sido o driver dos resultados da empresa há mais de 10 anos. O que as empresas digitais não tinham era uma forma de deter o caminho direto com os usuários, algo que está na mão das operadoras com a conectividade. Pelo menos até agora, dado que cada vez mais as grandes tecnológicas estão atrás de formas de garantir a própria conexão – até por questões da “net neutrality”, assunto quente lá pelos EUA. A Amazon, por exemplo, lançou o Sidewalk no ano passado: um protocolo de wi-fi próprio, voltado, num primeiro momento, à conexão dos seus sistemas de entrega. Unindo a isso, a empresa teve aval do governo norte-americano para lançar 3 mil satélites no espaço! Dentro do chamado “Projeto Kuiper” com o objetivo de, exatamente, prover internet para partes do globo. Isso sem contar em todo interesse que a companhia de Bezos mostrou pela operadora móvel Boost, da Sprint. As Big Tech também estão investindo em operadoras: neste ano, o Facebook fez aporte de US$ 5,7 bilhões na Jio Platform  e o Google investiu US$ 4,5 bilhões nesta mesma operadora. O que acontece se uma empresa como a Amazon consegue pular as empresas de telecomunicação e levar conectividade aos usuários diretamente? 

Digitando…

Responda rápido, qual o nome da mensagem que pode ser enviada entre celulares de diferentes operadoras? Tem conteúdo multimídia e validação de recebimento e leitura? Se você respondeu WhastApp ou Telegram, saiba que estas não são mais as únicas respostas. Isso mesmo, o RCS chegou. O Rich Communication Services é um tipo de mensagem que é enviada via internet entre celulares e que permite imagens, vídeos e textos. As quatro grande operadoras brasileiras já estão utilizando o sistema – e, em maio, até fizeram uma campanha em conjunto com dois governos estaduais. No final do mês passado, o que as telecom brasileiras anunciaram foi o RBM, um “RCS para a empresas”, ou seja, uma oportunidade para empresas mandarem mensagens mais ricas (até mesmo cartões de embarque!) para sua base. Quando falamos sobre telcos virando tech-cos, é uma boa hora para comentar que quem encabeçou o RCS e criou todos os protolos para estabelecer o RCS foi uma Big Tech, o Google… Ai fica o ponto: Big Techs estão virando Telcos ou Telcos vão virar Big Techs?

Vamos fazer uma call?

A adoção de videocalls e formas de se mandar mensagem via internet cresceu durante a quarentena, 88% dos brasileiros donos de smartphone fizeram uma videocall durante esse período, e como esse movimento foi global, a Verizon até se movimentou com a aquisição da Blue Jeans por US$ 500 milhões. Boa hora para lembrar aqui que o Facebook está unificando os seus aplicativos de mensageria e de videocall, e criando forma de monetizar as Lives para os produtores de conteúdo.

Follow the money

Para as operadoras, estes números, junto com os números estáveis de quantidade de celulares no Brasil, são mostra forte de que é necessário transformar os serviços que oferecem. Algumas companhias, como a Tim, olharam para outro lado: qual é o espaço em que o brasileiro pessoa física ainda não é digital? Nos bancos. Dessa forma, firmaram a parceria com o C6 para levar contas digitais à base de usuários da operadora. Em três semanas, o poder dessa base se mostrou: 200 mil contas abertas.

Poderíamos aqui comentar de várias outras operadoras que, por meio de parcerias, começaram a oferecer serviços digitais para seus clientes. A questão é que existe um limite nessa monetização via assinatura. Até quantos streamings um usuário pessoa física consegue assinar, ou quantos serviços-extra cabem no bolso dele? A Apple mesmo, que não é operadora, mas está na luta para aumentar a rentabilidade de sua base de usuários de iPhone, lançou uma série de serviços por assinatura separados e já viu que terá que unir todos em um “grande pacote” (o Rundle, que já falamos aqui). Assim, o espaço que está aparecendo cada vez mais para as operadoras está no B2B, mas não na venda de linhas corporativas, e sim no entendimento que as Telcos têm muito a oferecer para grandes marcas nos seus novos desafios digitais. Se a quarentena fez todo mundo usar mais videocalls, como falamos antes, ela também obrigou muitas empresas a se tornarem digitais. Usando o varejo como base: do ano passado para este ano, o número de lojas virtuais no Brasil foi de 900 mil para 1,3 milhão – e, de acordo com este estudo da PayPal, quase metade destas são de pequenos empreendedores. É um espaço que as operadoras já estão de olho em ocupar, vide a Claro que criou o Projeto Push do Bem, desenvolvido pela Hands, que tem como objetivo conectar os centenas de milhares de clientes de sua base B2B com dezenas de milhões de clientes B2C da Operadora. Sim, o início de um possível Carrier Marketplace. E se entre base de usuários, dados e capacidade de ativação, falta apenas o sistema de pagamento para fechar a conta de um verdadeiro Marketplace, vale lembrar que billing é core-business de Operadora desde quando jogávamos o jogo da serpente no Nokia 6120, ou desfilávamos com nossos Startacs por aí.

Dados as a Service

Diferente de algumas grandes empresas, as operadoras já têm uma grande premissa para captar dados dos usuários – elas oferecem um serviço vital para eles, e que pode ser otimizado conforme estes dados são compartilhados, é o que chamamos de Reciprocidade, e já falamos por aqui. Assim, o poder de data insights e decision analytics para essas empresas de telecom é maior, inclusive para oferecê-los em forma de serviço para empresas, o que chamamos de Aluguel de Audiência. Desta forma, diversas empresas que por vezes até possuem ferramentas poderosas de big data e analytics, mas não necessariamente possuem todo recheio para alimentar estes softwares, podem encontrar nos dados e soluções das Telcos uma solução plug n play para definição de estratégia, tomada de decisão e monitoramento de resultados, tudo em tempo real. 

Dados mudam tudo 

No Japão, a aposta da NTT Docomo foi ir para serviços B2B como inteligência artificial, marketing digital e billing integrado para e-commerce. A Docomo Digital, área de serviços digitais da NTT Docomo e parte do que eles chamam de Smart Life Business, está apostando nos pagamentos digitais em aplicativos para crescer. E não só isso, eles também contam com um serviço de inteligência artificial para pequenos empréstimos – sim, eles fizeram a parceria com uma startup para fazer a análise de dados da base de usuários e oferecer a bancos e fintechs a capacidade de fazer precificação de risco de financiamentos, algo que as Telcos brasileiras também já estão começando a fazer. De 2017 para 2019, a representatividade dos “Smart Life Business” no lucro total da NTT Docomo passou de 9% para 14,5%. 

Telco Ads

Com os diversos movimentos de mercado de grandes marcas procurando alternativas de mídia além do duopólio das Big Techs, as Telcos Ads vêm crescendo e ganhando espaço.

Em 2018, um artigo que um dos que aqui vos falam publicou sobre as movimentações das Telcos no mercado da Publicidade Digital já mostrava um pouco sobre as mudanças e possibilidades que já vinham acontecendo e estavam surgindo. Lá em 2012, a O2 fez uma joint-venture com a EE e a Vodafone chamada Weve. A ideia era criar uma ad network própria das Telcos. Em 2015, a O2 comprou toda a operação da Weve, mas acabou fechando em 2018 (alguns comentam que a relutância da O2 em se movimentar para formatos mais Mobile do que apenas o SMS e também de dividir mais os dados prejudicou a operação). A Weve, no entanto, não sumiu: virou um braço de dados e análise de comportamento dos usuários para o grande programa de rewards da O2. Se você lembra de como era o ambiente mobile em 2013, já sabe a diferença para hoje em dia: os apps não eram tão abundantes e a maioria das pessoas ainda estava começando a, de fato, confiar em funcionalidades como pagamento.

A Vodacom, braço sul-africano da Vodafone, também tem uma área específica para ads digitais, utilizando a sua base de 30 milhões de clientes no “bid” para publicitários. Isso sem falar na AT&T, Verizon e Altice, que fizeram investimentos milionários nas aquisições da AppNexus, Yahoo e Teads, respectivamente, criando ativos para entrada no mundo de conteúdo e advertising.

Versão brasileira

Este ano, a Oi lançou a Oi Ads, uma plataforma própria de ads, de fato olhando para a combinação da equação que tanto falamos por aqui. Já a Vivo possui a sua área de advertising há um tempo, a Vivo Ads. E Claro e Tim, apesar de ainda não terem feito barulho com marcas específicas para o mundo de Ads, já possuem tecnologias, produtos, pessoas dedicadas e receita vindo desse pilar.. 

So what

As Big Techs nos mostram que 4 grandes ativos são peças chaves para quem quer dominar o mundo digital, sendo que combinar 3 é o passe de entrada e unir os 4 é ouro: Usuários, Dados, Capacidade de Ativação e Transação Financeira.  Ao olharmos para o mundo das Telcos, os 4 ativos estão lá, sendo historicamente utilizados desde à época da venda dos ringtones, passando por diversos produtos e serviços que foram surgindo, mas ainda não de forma organizada com um ecossistema único end-to-end, gerando não apenas relevância para os usuários, mas também um canal para grandes marcas e anunciantes.

Porém, como mostramos nos movimentos acima, as peças estão começando a se encaixar. Vale entender se será através das Big Techs avançando mais uma casa, ou veremos nascer um nova força no mercado digital, com as Operadoras criando novos ecossistemas para apimentar a competição. 

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