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De volta para o futuro com Amy Webb

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Bem, 2021, acabou de começar, por isso dizemos, com toda certeza: sejam bem vindos a 2025. E a 2030. O futuro já está ali na esquina e, para desvendá-lo, trouxemos uma das melhores pessoas para decodificar o porvir: a futurista Amy Webb.

Criadora do Future Today Institute, Amy ficou conhecida pelos seus relatórios completos de projeções e tendências tecnológicas, o “Tech Trend Report” lançado anualmente no SXSW. Jornalista de formação, Amy trabalhou em redações por alguns anos até migrar para a área de future studies e futurismo e, hoje em dia, ela é um dos principais nomes, com até mesmo uma metodologia própria de foresight (que colocamos aqui, caso estejam interessados!). Ainda está um pouco perdido sobre o que nos reserva o futuro?! Amy responde aqui!


Antes de falar do futuro, vamos revisitar um pouco o passado – e porque esse é um assunto que adoramos por aqui – conta um pouco do sua trajetória de carreira.

Na sexta série, eu participei do “time” de “Future Problem Solvers of America” na escola e, sem perceber, eu comecei meu trabalho como futurista aos 11 anos de idade. Na universidade, eu optei por uma formação multidisciplinar, que incluiu economia, teoria dos jogos, ciência política, ciência da computação e música.

Depois de me formar, eu trabalhei como correspondente internacional na China e no Japão [para o WSJ], o que significa que passei meus 20 anos vivendo no epicentro das tecnologias emergentes, como smartphones e telas touch, além de ver de perto os sucessos iniciais com machine learning. Quando voltei para os Estados Unidos, tive dificuldade em me adaptar ao ambiente tradicional de redação. Eu estava convencido de que as notícias precisavam de um modelo de negócios radicalmente diferente para sustentar o jornalismo de qualidade – mas me cansei da apatia em relação à tecnologia emergente, então saí da redação.

Consegui financiamento inicial para iniciar um laboratório de P&D para notícias e mídia, e meu foco era explorar e construir novas técnicas de distribuição digital. Conforme minha equipe experimentava novos protótipos, fiquei interessado em tópicos muito mais amplos além do jornalismo, como como a terceira era da computação (IA) impactaria todas as facetas da vida cotidiana, como a tecnologia influenciava o equilíbrio geopolítico e como nossos dados poderiam se tornar um principal motor da economia. Eu queria modelar e mapear cenários plausíveis para o que esse futuro pode parecer, e foi quando um colega me indicou o trabalho dos primeiros futuristas como Robert Jungk e Alvin Toffler, e da modelagem quantitativa desenvolvida por Olaf Helmer e Nicholas Rescher. Tive aulas de previsão estratégica, li tudo em que pude e comecei a trabalhar em 2006, quando comecei o Future Today Institute (FTI). Tenho trabalhado em tempo integral como futurista quantitativo desde então.

(Entrevista ao site LifeHacker em 25 de julho de 2018)

Aqui no Morse já conversamos com alguns futuristas – inclusive com o pessoal da Future Hacker, de qualquer forma, explica para a gente: o que faz um futurista?

Meu trabalho é coletar dados quantitativos e também qualitativos – procurar sinais fracos nesses dados, encontrar padrões emergentes e, a partir deles, mapear tendências emergentes. Essas tendências não são o fim da linha – são a base para a criação de cenários de risco e oportunidade. Meu trabalho não é prever o futuro, porque isso não é possível. Meu trabalho é descobrir, dado o que sabemos ser verdade hoje, usando dados, onde provavelmente estaremos daqui a X anos – e tentar descobrir isso cedo o suficiente para que as empresas não tomem decisões sob pressão.

(Entrevista ao site Crain`s Detroit Business em 11 de abril de 2018)

Agora, diz para a gente: o quão no futuro a sua análise de cenários chega?

Eu não penso no tempo da maneira tradicional e linear. Para os futuristas, dizer que, no ano 2030, todos viveremos juntos e estaremos nos movendo em carros voadores é um absurdo. A teoria do caos nos diz que existem muitas variáveis ​​e que o avanço de uma tecnologia está bastante sujeito a influências externas – como desastres naturais, regulamentações governamentais, desenvolvedores inconstantes. Em vez de tentar prever como será o mundo no ano 2030, é melhor desenvolver uma série de tendências, cenários baseados em dados e estratégias que são recalibradas com frequência.

(Entrevista ao site do John Adams Institute em março de 2017)

Ou seja, mesmo para quem conhece, o futuro é imprevisível…

Como futurista, serei a primeira pessoa a te dizer que não é possível prever o futuro. A matemática não funciona. Se estou lidando com uma quantidade limitada de variáveis, então sim, posso ser capaz de fazer uma previsão. O motivo de estarmos continuamente surpresos é porque estamos apenas pensando taticamente sobre o que importa agora, ou estamos pensando fantasiosamente sobre um futuro mais profundo. O trabalho árduo é encontrar sinais no presente e modelar seus impactos de primeira ordem usando dados e estruturas rigorosas. As previsões são frágeis. O objetivo de qualquer bom futurista é a preparação.

A questão realmente é: como podemos reduzir a incerteza? Devemos todos tentar melhorar no confronto das nossas crenças tão queridas e aceitar o caos e o acaso como motores de mudança. Em última análise, a projeção estratégica não se trata de fazer previsões. É sobre como criar um estado de preparação contínuo e como saber quando agir. Isso inclui estar pronto para um evento caótico repentino, como um desastre natural ou uma pandemia global. O melhor trabalho de previsão estratégica resulta em insights, alinhamento interno e tomada de decisões mais rápida e baseada em dados. Gosto de usar a analogia do volante. Com algum esforço e esforço persistente, o efeito é uma redução na surpresa e na incerteza.

Não acredito em eventos “Black Swan”, aqueles que são imprevisíveis, que surpreendem totalmente e têm consequências graves. Nada é verdadeiramente instantâneo. Quando as pessoas falam sobre a pandemia como um “Black Swan”, elas estão erradas. O vírus surgiu em dezembro, os governos fizeram escolhas erradas e agora estamos lidando com as consequências. Muitos modelos previram que estaríamos nessa situação em dezembro se escolhas boas e disciplinadas fossem feitas.

(Entrevista ao Coindesk em 30 de setembro de 2020)

Todo ano, o FTI lança o Future Tech Trends, considerado um dos relatórios mais completos de cenários para a tecnologia. São centenas de tendências abordadas no relatório, mas você poderia dizer quais seriam as mais importantes?

Essa é sempre a primeira pergunta que me fazem: quais as mais importantes? E a resposta é sempre a mesma: depende de quem você é, de onde mora e com o que se ocupa. Para mim, particularmente, tenho prestado atenção nas tendências de políticas, agricultura e biologia sintética, que é essa desenvolvida em laboratório, como as “carnes” sem nenhum tipo de produto animal.

(Entrevista ao Neofeed em 17 de março de 2020)

Tendo em vista a dimensão da pandemia do coronavírus, seria necessário fazer algum tipo de alteração ou pelo menos acrescentar alguma outra tendência?

Certamente. Tenho um grupo de discussão sobre esse tema, reunindo economistas, futuristas e cientistas do mundo todo. Estamos todos empenhados em desenhar possíveis cenários para essa situação. Dia desses, um dos participantes, que é PhD em economia, levantou uma questão bastante interessante: será que poderíamos usar o blockchain para, de alguma maneira, resetar a economia global, que parece sucumbir com esse vírus? É uma proposta bastante ousada, mas seria basicamente definir uma data, digamos 20 de março, e permitir que o coronavírus siga seu curso natural. No final do processo, a gente “formataria” a economia usando blockchain para que tudo voltasse a ser como no dia 20 de março. Parece uma loucura, mas são teorias a se pensar – e certamente novas tendências podem surgir a partir delas.

(Entrevista ao Neofeed em 17 de março de 2020)

Você já afirmou que os dados serão o novo petróleo. Por que diz isso?

Agora mesmo, em 2018, o cenário da tecnologia é análogo ao cenário do petróleo na virada do século XIX para o XX, e até um pouco antes disso. Nos Estados Unidos havia muita gente envolvida, em especial empresários, em entender quais mudanças poderiam ocorrer. Havia grande pressa em capitalizar o petróleo. É algo muito interessante, pois dados e petróleo são semelhantes; depois que se descobre petróleo, é preciso saber como extraí-lo, refiná-lo. Antes disso, o petróleo não é útil ou é apenas um problema. Descobrir exatamente o que fazer com ele foi algo muito difícil. Isso ocorre com os dados. Se você não tiver as ferramentas e não entender o que pode fazer com eles, não importa. E as empresas estão entendendo como encontrar, extrair, refinar os dados. Só assim eles serão inseridos nos produtos e poderão gerar algum dinheiro.

(Entrevista à revista época em 29 de maio de 2018)

Sendo os dados o novo petróleo, você acredita que eles podem também motivar guerras?

Adorei essa pergunta, pois na verdade nunca falamos disso dessa maneira antes. Você está certo, no passado foram feitas guerras pelo petróleo, e o que vemos agora é algo como se cada lado estivesse preparando suas armas. A China está emergindo rapidamente como uma nova potência. Eles têm muitas pessoas, diferentes leis de privacidade e usam dados de maneira que resultam em novos meios de relações econômicas. É algo realmente fascinante. A realidade mostra que controles muito severos podem dificultar a vida de todos. Por outro lado, não ter controle nenhum também é ruim, também cria dificuldades. É o caso das pessoas que usam as redes sociais de forma inapropriada, como podemos ver diariamente. Isso ficará ainda mais complicado quando tivermos os dados se relacionando cada vez mais com inteligência artificial. Mas nós temos escolhas. Acredito que os desafios agora parecem ser, em regulamentação, fugir de um “ou tudo ou nada”. Temos de debater.

(Entrevista à revista época em 29 de maio de 2018)

Falando em “guerra”, no seu livro “Big Nine”, você fala bastante sobre como a China e os Estados Unidos estão criando uma guerra geopolítica em volta do controle da Inteligência Artificial (IA). Um ponto deste livro é abordar, também, o poder da “G-Mafia”, grupo das Big Tech americanas. Por que devemos nos preocupar com elas?

Existem 9 empresas responsáveis ​​pelo futuro da IA. Elas são as únicas que financiam, têm a maior parte das patentes e estão construindo o que chamam de ‘arquiteturas de código aberto’ – mas você tem que usar esses códigos em seus serviços de nuvem, então não é super open source.

É um pequeno grupo de pessoas trabalhando em um número muito pequeno de empresas que estão tomando decisões sobre o que otimizar usando os dados disponíveis … Mas a regulamentação não faz sentido porque deixamos de ter um pequeno grupo de pessoas tomando decisões sobre a otimização para um um pequeno grupo de legisladores, que leem muito bem e são pessoas muito inteligentes, mas que, em sua grande maioria, carecem de diplomas em ciências exatas e experiência técnica.

(Apresentação no World Economic Forum em 2019, como contado pelo site Inform)

As autoridades anticompetitivas começaram a agir, investigando tanto o Facebook quanto o Google, você acha que isso é o bastante para barrar a consolidação de poder pela “G-Mafia”?

A G-Mafia continuará a consolidar poder. Mesmo que as medidas antitruste sejam aprovadas nos Estados Unidos, e esse é um grande “e se”, é improvável que as empresas aceitem as conclusões das investigações e concordem em se separar.

Portanto, a questão é realmente sobre como a G-Mafia evolui? Amazon, Google e Apple estão fazendo movimentos ousados ​​e decisivos na área de saúde. Da pulseira Halo da Amazon ao Apple Fitness + e à aquisição da Fitbit pelo Google, grandes empresas de tecnologia estão trabalhando agora para coletar e analisar nossos dados de saúde.

Mas esses são apenas dispositivos que você usa no pulso – e os algoritmos de detecção biométrica que extraem, nos refinam e nos otimizam? Ou a mudança para dados e registros eletrônicos de saúde? E seguro de saúde, no caso da Amazon, e atendimento ambulatorial, no caso das clínicas de funcionários da Apple?

Se diminuirmos o zoom, a grande tecnologia entrando na área de saúde é apenas uma das muitas áreas em que vemos mudanças disruptivas acontecendo em um ritmo relativamente rápido. A Microsoft está construindo o futuro da agricultura inteligente. O Facebook está trabalhando no futuro das criptos e DLTs. A IBM é sempre ignorada, mas está dando passos importantes na arquitetura corporativa aberta para IA.

Eles estão todos competindo pelo CloudShare. A energia será consolidada de uma forma que será difícil de ver se você não estiver intencionalmente coletando dados e trabalhando para conectar os pontos entre produtos, serviços e setores. Eles estão acumulando mais poder e influência do que nossos governos.

(Entrevista ao Coindesk em 30 de setembro de 2020)

Quais os maiores erros que as pessoas fazem ao falar de cenários do futuro?

Os maiores equívocos que vejo têm a ver com inteligência artificial e nosso otimismo e medo equivocados. Desde a década de 1920, vivemos com a ideia de que “o futuro” significa robôs que falam, andam e agem como humanos e carros voadores. Por estarmos fixados nessas imagens indestrutíveis, perdemos a terceira era da computação em tempo real. Carros e robôs são meramente recipientes para IA. A verdadeira magia – e perigo – tem a ver com sistemas projetados para tomar decisões autônomas, sejam essas decisões grandes ou pequenas. Nossos sistemas de IA estão em algum tipo de desenvolvimento há dezenas de anos e, nas últimas décadas, vimos avanços importantes. Quais são as implicações desses sistemas de IA, criados por relativamente poucas pessoas que trabalham em apenas um punhado de empresas? O que acontece quando eles tomam mais e mais decisões de forma autônoma por todos nós? Isso é algo que me preocupa seriamente, mas as pessoas parecem mais interessadas em saber quando começarão a andar em um carro voador.

(Entrevista ao britânico Channel 4 em 26 de outubro de 2018)

Você sempre comenta que o futuro é flexível porque a gente tem a capacidade de agir e mudar o curso de tudo. Logo, queremos saber, qual o futuro que você quer ver?

Essa é uma pergunta fácil de responder. Eu gostaria de ver um futuro em que todos ainda tivéssemos agência, e minha preocupação é que estejamos cada vez mais longe de um futuro em que cada um de nós tenha a capacidade de tomar decisões, e isso porque controlamos cada vez menos os nossos dados – nossos próprios dados pessoais.

Estamos cada vez mais distantes dos algoritmos que extraem, refinam e processam esses dados, e temos muito poucos insights sobre como as decisões estão sendo tomadas em nosso nome e sobre quando essas definições estão acontecendo. Não há transparência em torno de como as decisões estão sendo tomadas e isso pode não soar como um problema técnico, porém toda a tecnologia que você usa na sua vida seja seu telefone, seu smartphone, ou seu e-mail ou o jogo que você está jogando … você quase não tem voz ou controle sobre como usar esse dispositivo e como ele o usa.

O desafio é que quanto mais nossa tecnologia se torna sofisticada em sua abordagem, mais nos aproximamos de uma realidade de User Interface zero, onde as coisas acontecem com mais facilidade; tanto mais que estamos permitindo que as pessoas programem máquinas para fazer máquinas para tomar decisões por nós. Esse futuro de ficção científica me apavora mais do que qualquer coisa que eu já vi no Black Mirror, porque é a vida cotidiana. Portanto, o melhor que posso esperar é que todos comecem a pensar nas implicações de toda a tecnologia a que temos acesso e cheguem a uma decisão unificada de que estamos prestes a possibilitar uma enorme tragédia dos comuns.

(Entrevista ao podcast Futures publicada em 4 de fevereiro de 2020)

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