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Ghost Interview

TED Talking com “o” TED Talker original!

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A explosão do Clubhouse, uma rede social baseada em voz, e o crescimento das lives (de maneira geral) nos fizeram pensar em como as conversas ainda têm o poder de cativar, entreter e, principalmente, ensinar as pessoas. Cruzamos isso com a nossa temática do Ghost Interview em Fevereiro, um especial sobre Learning, e chegamos em Richard Saul Wurman, o criador dos TED Talks!

A vida de Richard, com certeza, não cabe em uma newsletter. Ajudar a criar o Technology, Entertainment and Design (TED) Talks em 1984 foi apenas a pontinha do iceberg. Com 85 anos, Richard já escreveu umas boas dezenas de livros, um deles, ajudou a criar a carreira de “arquiteto da informação”, o outro, lá no final dos anos 80, já falava sobre uma expressão que conhecemos bem: a “ansiedade de informação”. Uma outra ousadia de Richard: propor uma Secretaria do Entendimento para os governos. Sim, espaços para ensinar os cidadãos sobre os principais assuntos discutidos na esfera estadual. E, porque não queremos dar mais nenhum spoiler de cara aqui, segue para a entrevista:


Richard, você já era um arquiteto conhecido, tinha alguns livros publicados, quando surgiu a ideia de criar o evento TED em conjunto com Harry Marks. O que o levou a criar o TED do jeito que conhecemos?!

O TED era um hobby, não era a minha vida. No começo dos anos 80, por causa do trabalho, passava muito tempo em aviões conversando com pessoas e as únicas pessoas interessantes eram as da indústria de tecnologia, entretenimento e design. Todo o resto era bem entediante. Essas pessoas não percebiam, na época, que estavam no mesmo negócio. Mas nenhuma dessas três profissões poderia fazer nada sem a ajuda das outras duas. Então, criei um nome inteligente, TED (Tecnologia, Entretenimento, Design), e convidei pessoas interessantes como Steve Jobs, que não fez apresentação mas trouxe o primeiro Apple Macintosh e Herbie Hancock, o pianista de jazz que compôs uma peça musical no computador pela primeira vez.

A inovação pode ser feita por subtração ou adição, como um iPhone. O iPhone não é uma invenção; é uma combinação de diferentes invenções. O TED era inovação por subtração. Quando fiz o primeiro TED em 1984, subtraí púlpitos porque seu papel é proteger quem faz a palestra e fazer a pessoa se sentir menos vulnerável e porque as pessoas os usam para colocar um pedaço de papel na mesa para que possam ler para você. Os palestrantes, nos TED Talks, não devem ler para você. Então eu subtraí isso porque eu não queria que eles lessem discursos e os queria vulneráveis.

(Entrevista ao site de notícias da UCD, University Observer em 31 de outubro de 2012)

E quais outras regras você acabou trazendo para o TED?!

Sem os púlpitos, os palestrantes não tinham como levar nada para ler, o que acabou forçando que eles conversassem com a audiência organicamente, no lugar de fazer algo preparado. Isso também manteve as conversas mais curtas.

“Eu ficava no palco 100% do tempo. Sentei-me ao lado de quem se apresentava. Quando um discurso se tornava demorado, eu me levantava e andava muito silenciosamente, ficava atrás da pessoa. A pessoa que estava apresentando entendia que tinha que acabar com a fala no momento.

(Entrevista à Fast Company em 17 de maio de 2016)

Até o seu último TED, você apresentava falando “bem-vindos ao jantar que eu sempre quis ter e não consegui”, era bem pessoal, não é?

Eu fazia a conferência que eu mesmo gostaria de frequentar. Na nossa sociedade, essa ideia pode soar um pouco pomposa, arrogante e babaca. Mas não é. Na verdade, é apenas uma maneira atenciosa de fazer as coisas.

(Entrevista à Fast Company em 17 de maio de 2016)

E qual exatamente era o tipo de conferência onde você queria estar?

Eu queria estar perto de pessoas que fossem mais inteligentes do que eu. Eu não queria ouvir caras de terno em painéis. Não estava interessado em políticos e CEOs ou em ter alguém lendo um discurso. Eu queria ficar longe de campos de golfe. Eu só queria ir a uma reunião que fosse interessante para mim, particularmente sobre tecnologia, design e entretenimento, e outras pessoas pareciam gostar.

(Entrevista à revista moment, publicada em 4 de outubro de 2013)

E como foi o primeiro TED, que rolou em Monterey, na Califórnia? Qual foi a reação do público?

Umas 300 pessoas vieram para o Monterey Conference Center, que tinha espaço para 500 pessoas. O público era composto em sua maioria por alunos, professores e pensadores. Perdi dinheiro na primeira conferência TED em si, mas aconteceu que as pessoas continuaram a falar sobre o TED muito tempo depois do fim do evento. E ele acabou viralizando, isso antes da internet, do SMS e do smartphone.

Para a gente, o que ficou do TED em 1984 nos mostrou que existe um poder nos “5 Cs”: curiosidade, convergência, conexão, comunicação e comunidade.

(Entrevista ao blog da American Express em 18 de março de 2014)

O atual líder do TED, Chris Anderson, comenta que você previu o formato perfeito para o YouTube. Mas teve uma coisa que você também “previu” que foi o tal do FOMO (fear of missing out) que é meio que uma ansiedade por informação, sobre a qual comentou no seu livro em 1989. Você acha que a explosão da internet como meio tornou esse problema pior?

A ansiedade pela informação não parece desatualizada se você ler agora. Mesmo com todas as mudanças que ocorreram, a premissa básica, então como agora, é que nunca tivemos uma explosão de informação, mas uma explosão de não informação. Se você entrar na Internet e colocar Richard Wurman, dependendo do dia, receberá mais de 400.000 citações. Isso representa mais ou menos cerca de quarenta mil páginas de lixo em forma de big data. Falo big data, não big information, porque a raiz da palavra de informação é a palavra informar. E a menos que algo realmente informe você, eu não chamo de informação. Portanto, não acho que haja uma explosão de informações. Há uma explosão de coisas em cada página do jornal que não conseguimos entender.

(Entrevista ao Brown Political Review em 21 de setembro de 2012)

Mas o que, exatamente, essa ansiedade de entendimento pode significar e como podemos fazer para diminuí-la?

Eu acredito que o governo [dos EUA] deveria ter uma Secretaria do Entendimento. Porque eu e muitos não entendem o orçamento, não entendem o Obamacare. Não entendem nada que venha a partir da imprensa governamental.

A gente acha que só porque algo está na manchete do jornal, ela se torna completamente absorvida e entendida. Então nos sentimos ansiosos porque não conseguimos entender o que achamos que é informação. Só acho que é a definição errada: há mais dessa não informação, o que chamamos de big data. Que porra é big data? São números, números simplesmente grandes pelo fato de ser grande.

E eu vou te dar a explicação, nossa tentativa de entender a figura “trilhão”. Um milhão de dólares é um bom dinheiro: se você perdesse um milhão de dólares todos os dias do ano, teria perdido US$ 365 milhões, certo? E se você perdeu esse dinheiro todos os anos durante séculos, do ano um até hoje, você ainda teria que perder um milhão de dólares todos os dias até 2738 para perder um trilhão de dólares. E no jornal de hoje e no de amanhã e no dia seguinte, em algum lugar a palavra um trilhão estará lá e nós concordaremos, pensando que entendemos o que estamos lendo. Essa é a ansiedade. Porque em nossa alma sabemos que não entendemos o que isso significa. Porque não conseguimos explicar para outra pessoa.

(Entrevista ao Brown Political Review em 21 de setembro de 2012)

Ou seja, não estamos num momento de ansiedade por muita informação, mas por pouco entendimento?

Uma boa parte das pessoas ainda acredita que tudo é informação, até aquilo que eles não entendem. E eles se culpam por não entender essa informação. Mas não é culpa delas. Mas não é culpa deles, é culpa de como foi apresentado, porque nada é apresentado em um formato compreensível. Portanto, temos ansiedade entre o que pensamos que devemos entender e o que fazemos de fato. Não se trata de big data, mas de big understanding.

(Entrevista à revista Interior Designs em 17 de junho de 2019)

Mas qual é a diferença entre dados e informação?

Muitas pessoas pensam que todas as palavras escritas e números são informações, mas se eles não informam – se você não os entende – são dados, não informações. Dados são o alfabeto, uma palavra com significado é informação. As pessoas não devem sentir ansiedade porque não conseguem entender o que estão lendo; eles deveriam culpar os autores.

Recentemente, a conversa se concentrou na frase de efeito “big data” como a próxima grande novidade na comunicação. Eu acho isso um absurdo. A próxima grande coisa é entender. “Big data” são dados com zeros depois. É um número, não é compreensão. Grande compreensão não é big data. Você só entende algo relativo a algo que você já entende. Entender é o que importa.

(Entrevista à revista moment, publicada em 4 de outubro de 2013)

Agora, Richard, o que significa “entender” algo?

O fundamental é entender como é não entender. Minha definição de aprendizagem é lembrar no que você está interessado. Se você não se lembra de algo, você não aprendeu, e você nunca vai se lembrar de algo a menos que esteja interessado nisso. Essas palavras dançam juntas. ‘Interesse’ é outra palavra sagrada e impulsiona a ‘memória’. Combine-os e você terá aprendizado. Se for assim, e eu acredito que todo o nosso sistema de educação está falido porque o que é ensinado a você não é o que você está interessado, e não é ensinado a você de uma maneira que acentue o seu interesse para que você construa o aprendizado você mesmo. Pelo menos não criam um interesse que crie em você a capacidade de conectar o que você gosta com outras partes do mundo. Então, por que não examinar seus interesses reais? Mas não é assim que nossos sistemas escolares são configurados. Você memoriza coisas nas quais não está interessado, joga-as em uma prova e depois as esquece.

Pense em um assunto geral que interessa às pessoas, como esportes. O esporte tem tudo. Tem finanças, sociologia, psicologia, ciências. Se alguém se interessa por esportes e é ensinado sobre esportes nesse tipo de contexto, vai se lembrar de tudo isso e aprender de verdade.

(Entrevista ao site e newsletter InfoDesign em janeiro de 2004)

E tem um ponto, ainda aqui na provocação sobre Big Data, entendimento e a audiência: existe uma procura enorme de conteúdo em atingir grandes públicos. O TED chegou a atingir algumas milhões de pessoas quando as palestras foram colocadas no YouTube, qual a importância desse efeito de massa?

Mil pessoas são apenas um erro do contador. Isso não significa nada. As mil pessoas que vieram ao TED eram estatisticamente insignificantes em comparação com os 300 milhões de pessoas na América.

Você não precisa vender um milhão de livros para ter um efeito, ou para tornar algo claro, ou para criar clareza na vida. Pequenos grupos, se eles forem os pequenos grupos certos, e eles são filtrados naturalmente para pessoas que contam a outras pessoas, isso é o suficiente. As comunicações virais são realmente muito interessantes.

(Entrevista à Fast Company em 17 de maio de 2016)

O que você acha que o TED se tornou agora?!

Comecei o TED para convidar quem eu quisesse e conversar com eles. Eu estava vendendo o fato de que pessoas que são realmente maravilhosas gostariam de ter uma conversa com alguém que falasse a verdade. Não é como o TED agora, eles não ensaiavam, não havia censura ou patrocínios, exceto para almoços. Hoje é uma série de pérolas, e há algumas pérolas bonitas, algumas pérolas irregulares, algumas pérolas de merda. O que fiz foi um colar, um evento de quatro dias. Não havia um tema, mas havia padrões.

(Entrevista à revista Interior Designs em 17 de junho de 2019)

Mas você não acha que, de alguma forma, o TED mudou a nossa visão sobre o que significa uma boa apresentação, mesmo que essas sejam apresentações ensaiadas?

Bem, acho que tem um efeito nas pessoas. Não acho que [atualmente] seja uma boa conferência. Mas eu acho que as palestras TED, mesmo em sua maneira ensaiada, têm um efeito porque trazem certas ideias para pessoas que nunca estariam fora de sua caixinha. Então, o efeito líquido eu acho bastante positivo.

Mas nos dezoito anos que fiz isso, não foi estatisticamente nada. No entanto, aquelas mil, dez mil pessoas, provavelmente de forma viral, tiveram um efeito em cem milhões de pessoas. E eu acredito que sim, porque várias novidades foram anunciadas em nossas conferências – o Google foi anunciado pela primeira vez e os primeiros Macs foram mostrados lá. E algo chamado Oak foi anunciado lá e mudou para Java. E o Photoshop e o Segway. E assim por diante. Foi interessante ver o futuro primeiro.

(Entrevista ao podcast The Conversation, publicado em 9 de janeiro de 2013)

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