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Data Driven or Data Mess?

Como os dados podem ajudar ou confundir as tomadas de decisões

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In God we trust, all others must bring data

A frase acima estampa diversas camisetas ou adesivos em salas de reunião e tem como objetivo trazer para os negócios um processo de tomada de decisão baseado em dados, entendendo ser esta a forma mais eficiente. Mas será que é isso mesmo? Ou melhor, “simples” assim?

No Morse Trends de hoje resolvemos olhar o tema de dados por um ângulo diferente, mostrando como eles podem sim trazer uma análise mais profunda e detalhada sobre situações e decisões, mas também como precisamos tomar cuidados com os dados, aprender a escapar de viés e “armadilhas”, além de considerar o acaso e a aleatoriedade em nossas análises e decisões. E, o Morse Trends de 2024 tem uma novidade, os temas que pautamos aqui na newsletter serão também discutidos em Podcast por nós e convidados, e o tema de hoje já está disponível aqui.

Descriptive, predictive and prescriptive

Antes de começarmos, um pouquinho de teoria que pode nos ajudar em nosso raciocínio. Muitas pessoas utilizam o termo “Preditivo” quando falam sobre dados, quase como se fosse uma bola de cristal para se ver o futuro, mas sem entender como isso funciona na prática. Para começar, a Análise Preditiva é uma de três formas distintas de interpretação de dados, e que devem andar lado a lado. As outras duas são Descritiva e Prescritiva, e as três são muitas vezes utilizadas de forma incorreta ou então “resumidas”, empacotadas como “Preditiva” quando na verdade devem ser analisadas de forma diferente e com cuidados diferentes.

Descriptive Analysis, ou Análise Descritiva, utiliza a agregação e a “mineração” de dados históricos para nos apresentar o que já aconteceu e descobrir padrões. Talvez seja a forma mais simples e mais utilizada por pessoas e empresas e, um dos primeiros erros aqui é pensar que o simples fato de algo ter acontecido de forma repetida, ou num mesmo padrão histórico, significa que continuará acontecendo no futuro. A Análise Descritiva não tem como objetivo prever acontecimentos. Sabe aquela famosa frase, “o que nos trouxe até aqui não necessariamente irá nos levar até lá…”? Ela se encaixa perfeitamente aqui. E o maior exemplo disso é quando empresas olham os dados de crescimento de um ano anterior para projetar o crescimento do próximo, sem entender que algumas variáveis podem mudar.

Para tentar projetar o verdadeiro futuro, existe a Predictive Analysis, ou Análise Preditiva, que usa modelagem estatística e técnicas de machine learning para, baseada nas fontes de dados passados e inputs de variáveis a serem consideradas, nos ajudar a identificar a probabilidade de resultados futuros. Esse talvez seja o maior desafio e ponto de atenção, pois além de ser algo complexo, a análise Preditiva muitas vezes vai servir de base para outras análises e para tomada de decisão. Por exemplo, uma empresa pode perceber que, com base na Análise Preditiva, e não mais na Prescritiva que comentamos antes, ao aplicar as variáveis corretas, o crescimento do ano que está por vir será pior do que a “tendência” que vinha acontecendo no ano anterior. Como exemplo prático podemos citar uma empresa de Turismo que tenha visto um crescimento grande ano passado (2023), mas ao aplicar no seu planejamento de 2024 uma variável importante, e que será bem diferente este ano, como o número de feriados, percebe que o seu potencial de receita poderá ser fortemente impactado se não fizer nada. Ou seja, entende aqui que existe uma relação de causalidade entre o número de feriados e seu faturamento, e precisa aplicar isso como variável no modelo de cenários futuros.

E se no caso acima será necessário fazer “fazer algo diferente” para crescer, existe uma análise que nos ajuda a entender, ou pelo menos projetar, o que pode ser feito e quais os resultados prováveis. A Prescriptive Analysis, ou Análise Prescritiva, nos permite aplicar nos modelos estatísticos as ações que podem ser feitas para tentar entender seus possíveis resultados e as probabilidade de que aconteçam. Aqui temos como exemplo os modelos que tentam entender qual o real impacto de um aumento de preços em algum produto. Numa análise incorreta alguém poderia achar que o simples fato de se aumentar em 20% o preço de um produto, ou um pacote turístico no exemplo acima, poderia aumentar em 20% o faturamento de uma empresa, mas sabemos que isso não é bem assim pois existem outras variáveis que podem ser impactadas negativamente com o aumento do preço, podendo inclusive gerar um efeito rebote com uma queda do faturamento. Este caso é mais óbvio e simples de se entender, mas existem situações similares conceitualmente, mas menos óbvias operacionalmente, que muitas vezes se mostram como armadilhas na tomada de decisão quando não se aplica, ou se aplica de forma errada, uma Análise Prescritiva.

Correlação vs Causalidade

Outro ponto importante na análise de dados e tomada de decisão é entender a diferença entre Correlação e Causalidade. O livro Everybody Lies traz um exemplo interessante quando comenta que se analisarmos dados sobre venda de sorvetes e ataques de tubarão em regiões litorâneas poderemos perceber um padrão, isso porque, no verão as pessoas tomam mais sorvete e ao mesmo tempo entram mais no mar e por consequências estatística estão mais expostas à ataques. Mas isso não quer dizer, obviamente, que tomar sorvete é causa para um ataque de tubarão. Ou seja, existe aqui uma correlação entre os acontecimentos e não uma causalidade. Já no exemplo que demos acima, da empresa de Turismo, ao analisar os feriados e o número de viagens e reservas, podemos dizer que existe uma relação de causa e efeito, ou seja, causalidade, entre o número de feriados em um ano e o faturamento da empresa. Olhando os 3 tipos de análises de dados que mencionamos acima, a Análise Descritiva, que aponta os acontecimentos históricos, pode por diversas vezes nos mostrar acontecimentos repetidos ou com padrões, que muitas vezes tendem as nos levar a crer que temos alguma alguma relação de causalidade, tentando nos direcionar de forma errada em nossa tomada de decisão. E é justamente a Análise Preditiva que busca tentar entender o que realmente tem causa e efeito e o que pode virar um padrão ou tendência nos modelos.

O andar do bêbado

Se você já entendeu os tipos de análise, e entendeu a importância de identificar as correlações e causalidades, vamos agora apimentar um pouco mais a discussão com algo mais simples, porém bem mais complexo (se nos permitem assim dizer). Será que realmente todos os acontecimentos de nossas vidas e nossas empresas possuem um porquê, que estão diretamente relacionados a dados e variáveis que podem ser mapeados, entendidos e projetados? Como fica o Acaso e a Aleatoriedade?

No livro O andar do bêbado: Como o acaso determina nossas vidas, o autor,  Leonard Mlodinow, aborda diversas questões, na linha da provocação do próprio título do livro, mostrando como que muitas vezes acontecimentos podem, e devem acontecer, pelo simples acaso e aleatoriedade, e tentar buscar padrões para projeções pode nos levar à alguns desvios de rota. Além disso, ele ressalta que isso pode acontecer não apenas nas empresas, mas em nossas vidas, pois nosso cérebro está sempre em busca de padrões e muitas vezes fica “mais confortável” com situações que estatisticamente são muito menos prováveis de acontecer mas “fazem mais sentido”.

Por exemplo, na análise estatística de probabilidades, a probabilidade de acontecimentos ocorrerem de forma repetida é menor do que a probabilidade de acontecerem de forma isolada. Por exemplo, a probabilidade de você jogar um dado e tirar o número 6 ou o número 2 é igual entre si, porém menor do que a probabilidade de você jogar um dado duas vezes e tirar 6 na primeira e 2 na segunda. Ou seja, quando você coleciona situações ela diminui a probabilidade de acontecer e isso muitas vezes nos confunde.

Vamos à um exemplo prático. Imagine uma pessoa solteira que esteja em busca de conhecer alguém e saia num sábado à noite. A pessoa escolhe sua melhor roupa, o melhor sapato, o melhor penteado e vai para o melhor lugar. Mas, infelizmente, nada acontece. Dois dias depois ela encontra sua melhor amiga que vem comentar toda animada que conheceu alguém super bacana na fila do supermercado, quando estava saindo da academia, toda suada e descabelada.

Essa situação provavelmente levaria a pessoa que se arrumou toda para o sair no sábado a se frustrar muito; “como assim me arrumo inteira, vou no melhor lugar, e nada acontece e minha amiga consegue conhecer alguém assim, toda suada e na fila do mercado?”

Pela teoria do Acaso e Aleatoriedade, ambas estavam sujeitas a bater de frente com alguém interessante em qualquer situação de suas vidas, porém a pessoa do mercado acabou encontrando porque aconteceu, e contou essa história “olhando para trás”, já a pessoa que se produziu toda colocou mais variáveis em sua probabilidade de conhecer alguém, ou seja, a fórmula para entender como teria sido ela conhecer alguém naquele dia seria:

Probabilidade de conhecer alguém x Probabilidade de acontecer quando está com aquele vestido x Probabilidade de acontecer quando está com aquele sapato x Probabilidade de acontecer naquele local x Probabilidade de acontecer naquele dia

Já a amiga, tinha apenas a probabilidade de conhecer alguém em sua fórmula de cálculo de probabilidades, ou seja, apesar de suada e descabelada, a chance era estatisticamente maior…

Para ficar mais claro, se a amiga, que teve o acontecimento ao acaso, tivesse isso como meta, ou seja, querer conhecer alguém no dia específico, na fila do mercado, estando com roupa de ginástica e descabelada, a probabilidade dela também seria muito menor caso fosse essa uma projeção olhando para frente e não vendo um acontecimento já existente.

Isso não significa que as pessoas não devam se arrumar para encontros :), mas quando se colocam muitas variáveis “o cérebro encontra mais conforto” na probabilidade, aumentando a nossa expectativa, enquanto na verdade estamos desafiando a estatística e a probabilidade e correndo maior risco de frustração.

E isso acontece muito em empresas. Imagine o caso no qual o maior contrato a ser fechado em um ano pode acontecer por questões aleatórias e adversas, como por exemplo um vendedor encontrar um cliente antigo num restaurante, logo após ele ter tido um grande problema com um fornecedor e sentar na mesa para desabafar, sendo ali a oportunidade para trazer o cliente de volta. Ou seja, a maior venda do ano não veio seguindo o melhor script de vendas já provado estatisticamente em diversas outras situações, mas sim pelo acaso e aleatoriedade, assim como o caso do supermercado. Mas, e aí, a empresa deve então derrubar o script de vendas e mandar todos os vendedores saírem para almoçar em busca de clientes que tenham acabado de brigar com seus fornecedores atuais?

A verdade é que o cérebro humano foi configurado para encontrar ordem onde ela não existe e frequentemente tomamos decisões erradas com base em padrões, muitas vezes, imaginários. Não sabemos lidar e aceitar o acaso e a aleatoriedade, apesar deles controlarem boa parte de nossas vidas, tanto na vida profissional quanto pessoal. A nossa provocação de hoje não é abandonar a análise e estudos dos dados do seu negócio, mas mostrar como fazer isso com cuidado e abrir espaço para considerar o acaso e a aleatoriedade no processo de análise e tomada de decisão. Em nosso Podcast do Morse Trends discutimos exemplos práticos, percepções e opiniões sobre esta temática! Fica o convite para ouvir e acompanhar nosso raciocínio, e é claro, dar o seu feedback e opinião.

Ouça agora o Podcast do Morse Trends:

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