Ghost Interview

OKR tá ok?!

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O primeiro trimestre de 2021 acabou. Com ele, estamos aqui calculando nossos Objectives and Key Results, OKR’s para os mais íntimos, avaliando as entregas de Q1, planejando o que vamos buscar para o próximo trimestre e calibrando algumas rotas. Imaginamos que não estamos sozinhos nesta empreitada, e por isso o Ghost Interview de hoje tem absolutamente tudo a ver com isso! Nesta semana, aproveitamos o timing para correr atrás de John Doerr, um dos principais responsáveis por trazer a metodologia do OKR para o mundo da tecnologia e autor do livro Measure What Matters (audio book e impresso), que inclusive recomendamos muito 🙂

John trabalhou um tempo na Intel, nos anos 70, para depois migrar para a Kleiner Perkins nos anos 80, quando pouquíssimos se arriscavam no mundo do Venture Capital. Foi de estar tão próximo de empresas crescendo que ele percebeu que as ações que funcionavam eram principalmente aquelas que criavam mais foco dentro das empresas. Quando ele percebeu que a metodologia de OKRs, que ele já conhecia, servia perfeitamente dentro dessas empresas de inovação, ele passou a mostrá-la para alguns executivos de startups, com quem tinha contato por causa do VC. Dois dos que o escutaram foram Larry Page e Sergey Brin, lá em 99… Bem, o resto, a gente deixa para John contar. Além disso, ele ainda comenta um pouco sobre os desafios de manter os OKRs numa empresa – e o que fazer na hora de recrutar/crescer.


John, onde você aprendeu a aplicar a definição de metas por OKRs?

Meu primeiro contato com as OKRs foi em 1970 na Intel. Na ocasião a Intel estava em uma transição importante, transformava-se em uma empresa de microprocessadores, e a equipe precisava de pessoas focadas em um conjunto de prioridades para garantir que a transição acontecesse de forma bem sucedida.

Criar o sistema de OKRs ajudou tremendamente e todos nós compramos a ideia. Eu lembro de ter ficado intrigado no início com a ideia de ter um farol ou uma estrela do norte para nos guiar, e que de fato ajudou muito a direcionar as prioridades.

Foi incrível também ver o poder das OKRs do Andy, as OKRs do meu gerente e as OKRs do time. Eu estava rapidamente pronto para direcionar o trabalho para as metas da empresa, e a cada novo trimestre tínhamos novas OKRs definidas.

(Entrevista ao blog da Betterworks em 24 de abril de 2014)

E, bem, o que é o OKR?

“Objectives and Key Results”, ou OKR, é um sistema simples de definição de metas que funciona para organizações, equipes, e até mesmo para indivíduos. Os objetivos são o que queremos realizar. Resultados chave são como vamos fazer aquilo acontecer. Objetivos. Resultados chave. O que e como. Mas eis a verdade: muitos de nós estão definindo metas da forma errada e a maioria de nós não está definindo meta nenhuma. Muitas organizações definem objetivos e os alcançam. Elas fazem distribuição das vendas, introduzem novos produtos, constroem seus resultados, mas falta a elas o senso de propósito para inspirar suas equipes.

(Apresentação “Why the secret to success is setting the right goals” no TED Talk, TED2018, em 11 de junho de 2018)

Como funciona para definir metas? Qual a coisa mais importante que um OKR tem que ter?

O objetivo é o que eu quero realizar. Os principais resultados são como farei isso. Os objetivos normalmente duram mais. Eles são ousados e aspiracionais. Os principais resultados são agressivos, mas sempre mensuráveis, limitados no tempo e em número.

Uma das coisas poderosas sobre este sistema é que, em qualquer nível de uma organização, você só terá dois ou três, ou talvez quatro ou cinco objetivos. E três ou mais resultados-chave. Portanto, requer uma espécie de rigor e disciplina ao dizer: essas são as coisas mais importantes que estão acontecendo em uma organização. Não é a soma total das tarefas. Não é a ordem de serviço para a empresa. É tudo o que nós, como equipe, concordamos que merece atenção especial e é realmente importante. Na Intel, Andy Grove fez com que postássemos nossos OKRs pessoais fora de nossos gabinetes, para que todos pudessem vê-los.

(Entrevista à Harvard Business Review em 4 de maio de 2018)

O mais legal do OKR é que ele consegue que, tanto os indivíduos, quanto setores inteiros da empresa consigam se conectar com o que é foco para a empresa. Qual o maior desafio para as empresas adotarem esse sistema?!

A maioria das organizações não é transparente internamente com os objetivos que definem. O primeiro passo é adotar o estabelecimento de metas transparentes internamente, para que se possa obter alinhamento coletivo. Então, cabe a uma organização decidir. Existem OKRs “comprometidos” e OKRs “ambiciosos”. Algumas organizações definem e comunicam metas ambiciosas externamente. Ao fazer isso, alguns agregam valor durável. Imagine se nossos hospitais, escolas e instituições governamentais definissem OKRs e os compartilhassem publicamente. Eu posso ver um valor imenso nisso.

Em termos gerais, você não vincula bônus ou comissões de vendas a este sistema. Para que o sistema funcione bem, espera-se que os colaboradores individuais e a gerência atinjam 100% de suas metas de 100% e até 70% de suas metas ambiciosas ou de extensão. Você tem que ser “seletivo”. Uma das melhores coisas sobre o sistema é que ele exige que você faça escolhas sobre o que é importante e o que não é, e as compartilhe com todos.

(Entrevista à revista Barron’s em 5 de maio de 2018)

Já que você citou o Google, conta para a gente, como foi que o Google acabou colocando o OKR como o seu sistema de metas?

Em 1999, levei minha apresentação de 30 slides, com o Willy Loman, para uma reunião com dois desistentes de Stanford de 24 anos que acabara de conhecer. Eles eram Larry Page e Sergey Brin, e dirigiam o Google em uma garagem. Apresentei a eles os meus slides sobre OKRs e, no final, disse a Sergey: “Você pode tentar?” Ele respondeu com entusiasmo: “Sim, John, vamos”? Não é bem isso. O que ele disse foi: “Não temos uma maneira melhor de gerenciar esta empresa, então vamos dar uma chance a este sistema”. Eu tomei isso como um endosso sonoro ao que estava pesquisando fazia anos.

A cada trimestre, desde então, cada Googler escreveu seus objetivos e resultados principais, avaliou-os e publicou-os internamente para que todos pudessem ver. Eles nunca vazaram e, mais tarde, são jogados fora. Eles não são usados para bônus ou promoções. Uma boa nota é 70%. É normal falhar. Eles servem a um propósito mais elevado, que é obter um compromisso coletivo em torno de metas extraordinárias de expansão.

(Entrevista à revista Barron’s em 5 de maio de 2018)

Mas o Google não parou por aí. Você tem algum exemplo de um uso do OKR que acabou levando a um produto de sucesso?

Em 2008, uma pessoa do Google, Sundar Pichai, aceitou o objetivo de construir a próxima geração de plataforma cliente para o futuro das aplicações web. Em outras palavras, construir o melhor browser. Ele foi muito atencioso no jeito como escolheu seus resultados chave. Como medir o melhor browser? Poderia ser cliques em anúncios ou engajamento. Não. Ele disse: “Número de usuários”. Pois são os usuários que irão decidir se o Chrome é um ótimo browser ou não. Ele tinha um único objetivo de três anos: construir o melhor browser. A cada ano, ele mantinha os mesmos resultados chave: número de usuários, mas ele subiu a aposta. No primeiro ano, a meta era 20 milhões de usuários, mas não conseguiu cumpri-la. Ele conseguiu menos de dez. No segundo ano, ele subiu a meta para 50 milhões. Ele conseguiu 37 milhões de usuários. Um pouco melhor. No terceiro ano, ele subiu a meta mais uma vez para 100 milhões. Ele lançou uma campanha de marketing agressiva, ampliou a distribuição, aperfeiçoou a tecnologia e bum! Ele conseguiu 111 milhões de usuários.

(Apresentação “Why the secret to success is setting the right goals” no TED Talk, TED2018, em 11 de junho de 2018)

Alguns criticam o OKR, falando que o sistema diminui a criatividade e a capacidade do time de tomar riscos. O que acha sobre essa visão?

Eu sou muito questionado sobre isso. E a resposta curta é não. Mas acho que uma resposta ainda melhor vem de alguém que pode parecer um improvável seguidor dos OKRs: Bono Vox, do U2! Ele usa OKRs em sua organização sem fins lucrativos ONE, para focar todos na organização na eliminação da pobreza global.

Bono disse para mim em algum momento: “Você é apaixonado. Eu estou apaixonado. Que ação sua paixão o leva a fazer? Se o coração não encontra uma rima perfeita com a cabeça, então sua paixão não significa nada. [OKRs]nos proporcionam um ambiente favorável ao risco e à confiança, onde fracasso não é um crime federal. Quando você tem a estrutura certa, o ambiente e as pessoas certas, a mágica está ao virar da esquina.

(Apresentação em Live da Betterworks em 5 de junho de 2020)

A gente entende o poder dos OKRs e até o que eles conseguem entregar na empresa. Mas, e o que eles não conseguem fazer?

Deixe-me encerrar dizendo que os OKRs não são uma bala de prata, não são um tipo de poder mágico. Gosto de pensar nos OKRs como vasos transparentes nos quais colocamos os valores que são importantes para nós, porque não é a soma de todas as tarefas. São as poucas coisas que você, em qualquer nível em que esteja na organização, escrevendo para você mesmo, escrevendo para sua equipe, escrevendo para toda a empresa, o que você acredita que mais importa.

(Apresentação em Live da Betterworks em 5 de junho de 2020)

Como os OKRs se diferem ou complementam o sistema Agile?

O Agile orienta seu trabalho do dia-a-dia. OKRs não ditam o seu comportamento diário. Eu diria que este é mais um check-in semanal. Mas não é definir os objetivos e, em seguida, colocá-los em uma gaveta e ignorá-los. As pessoas realmente se importam se o CEO está observando ou não seus objetivos ou torcendo por eles. Se um líder quer uma maneira de entrar em contato com uma organização, esta é uma ótima ferramenta para fazê-lo.

(Entrevista à Harvard Business Review em 4 de maio de 2018)

Antes de ser um “evangelista dos OKRs”, você era um líder numa das principais firmas de VC do Vale do Silício. Passaram pela sua mão investimentos iniciais em empresas como Google e Amazon. Quais as perguntas que você fazia antes de acertar uma rodada de aporte?

Eu olho para o empreendedor. E tenho um grupo mais “suave” de perguntas: qual é a sua visão do negócio? Que tipo de time você pensa em recrutar? Quanto de equity você está preparado para oferecer para eles? Quais outros empreendedores você admira?

Esses tipos de perguntas me darão uma noção boa o suficiente de: “Qual é a missão de sua organização?” Por um tempo, todo mundo quis ser o Uber disso ou o Uber daquilo.

Isso não é uma missão.

(Entrevista ao podcast RecodeDecode em 19 de maio de 2018)

Mas o que é mais importante ao medir uma empresa que está crescendo?

No mundo de hoje, há muita tecnologia, muitos empreendedores, muito dinheiro, muito capital de risco. O que falta são ótimas equipes. O maior desafio do empreendedor será formar uma boa equipe. Há uma enorme mudança em andamento em todas as facetas do mundo. Algumas são impulsionadas pela tecnologia, outras pelo mercado. Todas essas mudanças criam oportunidades sem precedentes. Mas para aproveitar ao máximo essas oportunidades, é preciso se concentrar na equipe. As equipes ganham.

(Entrevista à Fast Company em 28 de fevereiro de 1997)

Quais qualidades você acha que esses empreendedores precisam cultivar tanto neles, quanto nestas equipes que estão nascendo?

Em organizações novas é vender bem. Todos estão vendendo. E eu acho que vender é um “chamado” – seja você um engenheiro, uma recepcionista ou alguém responsável por receber pedidos.

Eric Schmidt, do Google, costumava dizer “O crescimento cobre muitos pecados”. Mas se você não tem um negócio que está crescendo, você está em uma situação difícil.

Normalmente, a coisa mais difícil é conseguir pessoas realmente excelentes para ajudá-lo a expandir o seu negócio. Portanto, recomendo que os empreendedores – desde o momento em que se levantam de manhã até quando não podem fazer mais nenhum progresso – que gastem todo o seu tempo recrutando, entrevistando e tentando formar equipes diversificadas.

(Entrevista ao blog da Stripes – sem data definida)

Como os fundadores podem ficar melhores em recrutar?

Acho que o principal é que ele precisa garantir que tem uma mensagem muito clara sobre seu próprio negócio. E eu testaria isso para ter certeza de que outras pessoas entendem qual é o seu negócio e por que ele é importante. Eu escreveria uma solicitação de emprego para qualquer pessoa que você contratar.

As organizações se adaptam aos talentos das pessoas que trabalham nelas, mas você deve deixar claro o que está procurando. O ideal é que você tenha alguém além de você para ajudá-lo a contratar – um cofundador, por exemplo. A responsabilidade da contratação não deve recair apenas sobre seus ombros, mas é também um esforço de equipe.

(Entrevista ao blog da Stripes – sem data definida)

Olhando para sua carreira, qual foi a maior mudança que você viu nas startups?! E quais foram as lições mais importantes que você aprendeu?!

A maior mudança que eu vi é a abordagem deles para suas equipes. Para muitos, senão a maioria deles, esta é a primeira vez que construíram uma equipe, contrataram outras pessoas para fazer o trabalho, inspiraram-nos a fazer os tipos de sacrifícios necessários para iniciar um novo negócio significativo. Startups são difíceis, é um mercado que pode ficar muito feio. E então eu vi o melhor dos melhores realmente crescer em sua capacidade de construir e gerenciar uma equipe.

(…)

Acho que o mais importante que aprendi é o poder das pessoas. Se você coloca as pessoas em primeiro lugar e coloca o foco delas em todas as suas decisões, se realmente gosta das pessoas e deseja ajudá-las, então as coisas tendem a funcionar bem. E isso não se aplica apenas aos negócios, isso se aplica amplamente, à vida.

Acredito que a família vem em primeiro lugar e a maneira de dar sentido à vida é por meio dos outros. Essa é uma lição muito importante e orientadora.

Também acho que entusiasmo, otimismo, humor, serviço – todas essas são qualidades poderosas que permitem que você ajude as pessoas a fazer mais do que qualquer um pensa ser possível com menos do que alguém pensa ser possível. A propósito, essa é a minha definição de empreendedor: alguém que faz mais do que qualquer um pensa ser possível com menos do que qualquer um pensa ser possível.

Agora, na indústria de risco, tudo gira em torno dos empreendedores. Os capitalistas de risco deveriam realmente ficar de lado ou fora do palco. Acho que prestamos muita atenção aos VCs.

(Entrevista ao blog da Stripes – sem data definida)

Por último, muito tem se falado atualmente sobre os OKRs pessoais, e sobre como criá-los. Você tem os seus?! E quais são?

Sim, tenho um conjunto de objetivos pessoais e resultados-chave. A maioria dos meus tem variado no tema “família” . Agora as minhas duas filhas estão indo para a escola, mas anos atrás eu acreditava que fazer jantares em família juntos era a chave para ter uma família feliz. Portanto, meu principal resultado era chegar em casa para jantar às 18h, pelo menos 20 noites por mês, e estar presente, todos sem o telefone na mesa. Na verdade, os telefones ficavam em outro quarto. E isso é muito difícil de fazer. Eu estava vivendo no limite de 70%, é um bom resultado – isso significaria 14 ou 15 noites por mês.

(Entrevista à Harvard Business Review em 4 de maio de 2018)


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